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1° Fórum de Desenvolvimento Econômico Periférico debate caminhos para a atividade territorial

Território, desenvolvimento, atividade econômica e impactos populacionais. Estes foram alguns dos temas que nortearam a realização do 1° Fórum de Desenvolvimento Econômico Periférico da Fundação Tide Setubal.

 

O evento teve como objetivo, ao dialogar com as diretrizes do Programa Nova Economia e Desenvolvimento Territorial da Fundação, refletir sobre as economias periféricas. Essa mesma lógica passou também pela proposição de alternativas de combate às desigualdades econômicas e territoriais.

 

Com base nessa premissa – e na intersecção entre gênero e raça -, Kenia Cardoso, coordenadora do Programa Nova Economia e Desenvolvimento Territorial, destacou o fato de a maioria populacional que ocupa postos informais de trabalho ser negra. E, com isso, a subutilização no mercado de trabalho tem prevalência nesse segmento sociorracial. “Trata-se, então, de pessoas que têm mais disponibilidade para mais horas de trabalho disponíveis, mas não encontram trabalho. Ou, então, têm qualificação para encontrar trabalhos melhores, mas ainda assim não encontram.”

 

Ainda nesse contexto, Kenia Cardoso reforçou, na introdução do 1° Fórum de Desenvolvimento Econômico Periférico, a perspectiva sociorracial e seus impactos na inserção dentro do mercado de trabalho. “Será que é só uma questão de falta de oportunidade? Há algo mais profundo que diz respeito ao modelo produtivo brasileiro, que é no sentido de as massas negras, pardas e indígenas, que foram arremessadas na economia, não terem sido absorvidas. Foi a partir daí que nasceu a categoria de trabalho informal e de subutilização. Para além de um dispositivo que exclui a população racializada, o racismo é um dispositivo que molda a nossa economia.”

 

Desse modo, a coordenadora do Programa Nova Economia e Desenvolvimento Territorial da Fundação Tide Setubal destaca o papel do racismo no processo de exclusão de pessoas negras no mercado de trabalho. “O racismo é um dispositivo que molda a nossa economia. Ao entendermos que essa é uma economia que parte da ideologia racial para funcionar, considero que temos pistas para propor saídas um pouco mais assertivas.”

 

Imagem de Kenia Cardoso. Ela é uma mulher negra e usa tranças em formato box braid. Ela está com uma camisa na cor branca.

Kenia Cardoso (Foto: Lucas Santos)

 

Sobre o sentido e o futuro do trabalho

O painel inaugural do 1° Fórum de Desenvolvimento Econômico Periférico teve como tema Sentido e futuro do trabalho: de Keynes a Lélia Gonzalez e Nego Bispo. A mesa contou, então, com as participações das seguintes pessoas especialistas:

 

  • Márcio Farias, psicólogo e professor do departamento de Psicologia Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP);
  • Vilma Martins, agricultora e integrante da organização Mulheres do GAU;
  • Gilvânia Gonçalves, do Movimento dos Trabalhadores Sem Direitos;
  • Mariana Almeida, diretora-executiva da Fundação Tide Setubal (mediação).

Atividade econômica no cotidiano

Durante o painel inicial do 1° Fórum de Desenvolvimento Econômico Periférico da Fundação Tide Setubal, Gilvânia Gonçalves destacou as consequências que o trabalho por meio de plataformas digitais têm sobre profissionais que aderem a esse tipo de modalidade profissional.

 

Nesse sentido, a liderança do Movimento dos Trabalhadores Sem Direitos aborda a importância de conscientizá-los sobre a necessidade de poderem contar com seguridade social mesmo trabalhando de modo autônomo. Isso passa, então, por mostrar que o modus operandi de tais aplicativos – de mobilidade urbana ou de entrega de alimentos, por exemplo – equivale ao controle feito por patrões. Isso “porque, se eles recusam uma [corrida] ou se um cliente reclama, eles são cortados e não podem trabalhar.”

 

Assim sendo, o processo de conscientização passa pelo trabalho de base, por meio de conversas com tais profissionais. Ao trazer o próprio exemplo, Gilvânia Gonçalves fala sobre o diálogo contínuo com profissionais para mostrar a necessidade da organização coletiva contra a exploração. “Foi por meio de uma pessoa conversando comigo, uma frase curta me conscientizou e me trouxe a consciência de classe. É isso o que fazemos, então: trabalho de base nas periferias, nos bolsões e nas redes sociais.”

Reflexão e necessidade de mudanças

Em consonância com essa abordagem, Mariana Almeida, diretora-executiva da Fundação Tide Setubal, destacou outro ponto nesse debate que ganha relevância no diálogo com pessoas profissionais. A saber, trata-se da busca por qualidade de vida para além do mercado de trabalho e equilíbrio entre as dimensões profissional e pessoal.

 

Essa demanda, que tem sido também presente entre as juventudes, requer também a formulação de políticas públicas com foco na garantia e intensificação de direitos nessa direção. Além disso, essa reflexão demonstra a complexidade desse tema, inclusive pelo fato de profissionais jovens e de trajetória periférica recorrerem também à plataformização, mesmo ao não terem direitos trabalhistas, para, entre outros pontos, equilibrar vida e trabalho.

 

“Quais são os aspectos do formato do trabalho flexível e que, do ponto de vista dos direitos, do acesso à renda, da instabilidade e da falta de previsibilidade, se reconhece superbem todos os problemas disso e que, de fato, faltam políticas públicas para tratar essa parte? Que aspectos são esses em relação à condição de dignidade ao processo de formação familiar e ao ato de escolha também que acabam aparecendo? Quais os impactos disso, inclusive na formação da relação das juventudes nas periferias com o trabalho?”, pondera Mariana.

 

Imagem de Mariana Almeida. Ela é uma mulher branca, tem cabelo na tonalidade castanho-escuro e usa uma blusa laranja. Ela aparece gesticulando enquanto fala durante o evento.

Mariana Almeida (Foto: Lucas Santos)

 

Márcio Farias segue abordagem semelhante para falar sobre mudanças que aconteceram no passado e, assim, discutir o sentido e futuro do trabalho. E isso passa por debater as consequências da realização da Reforma Trabalhista, em 2017. “Não me parece possível qualquer discussão que não envolva discutirmos seriamente, enquanto sociedade civil, as revisões da Reforma Trabalhista. Não é possível avançarmos em qualquer discussão sobre o mundo do trabalho sem uma profunda discussão sobre ela. Precisaremos fazer uma discussão sobre ela, a Reforma da Previdência e todas as garantias de direitos foram sendo perdidas no último período.”

 

Das consequências das reformas ao presente e o futuro

Ainda nesse contexto, o docente da PUC-SP destaca que uma das consequências desse episódio – e a consequente perda de direitos trabalhistas – foi a busca pelo empreendedorismo. Logo, será necessário haver uma reflexão profunda sobre esse panorama a partir do empreendedorismo. E isso passa pelo panorama de pessoas negras, em especial mulheres, que ocupam os postos profissionais mais vulnerabilizados. “Porque mulheres negras querem empreender primeiro por precisarem sobreviver, mas também porque querem dizer que não querem mais ser submetidas a humilhações.”

 

A participação de Vilma Martins no 1° Fórum de Desenvolvimento Econômico Periférico trouxe essa perspectiva à dimensão prática. Durante a sua intervenção, a integrante da organização Mulheres do GAU falou sobre situações profissionais, de quando trabalhava como diarista, referentes a condições degradantes impostas por empregadores.

 

E o desconforto com isso intensificava-se por demais aspectos, como longos e extenuantes deslocamentos no transporte público e pela dupla jornada em casa. Isso a motivou a ingressar em um projeto de horta comunitária quando soube a respeito dele que, tempos depois.  E após formações do Sebrae e apoio das organizações UniKebradas e Instituto NUA -, culminou na criação e fortalecimento do Mulheres do GAU.

 

E esse contexto conecta-se, então, com fatores como impacto socioambiental, propósito e felicidade em âmbitos profissional e pessoal. “Hoje temos a felicidade de acolher mulheres negras, [mães] solo, mulheres que já passaram violência doméstica e tiveram depressão. Sou muito grata, pois já estive naquele lugar, por saber que acolhemos hoje essas mulheres para que possam ser felizes. A única coisa que quero que elas sejam ali é que elas sejam, pelo menos, felizes ali”, comenta.

Percepções da audiência

Um aspecto em comum que vem à tona por meio dos diálogos do 1° Fórum de Desenvolvimento Econômico Periférico da Fundação Tide Setubal abrange o papel do poder público para proporcionar condições mais estáveis para pessoas empreendedoras poderem atuar nas periferias.

 

Esta dinâmica, que esteve também presente nas percepções sobre o tema que o público presente ao evento apresentou, foi discutida por Jorge Kazuo, idealizador da iniciativa KazuEduca e diretor de Dados e Inteligência da organização Pulse Mais.

 

Ao destacar que o desenvolvimento econômico periférico é um assunto complexo e que as soluções precisam ser traçadas coletivamente, Kazuo comenta que se trata de um assunto complexo. Além disso, ele considera que “precisa de políticas públicas para o alcance ter efetividade, volume e profundidade de impacto – que é o mais importante. Então, é essencial que as políticas públicas estejam inseridas nesse contexto.”

 

+ Confira como foi o segundo dia do 1° Fórum de Desenvolvimento Econômico Periférico

 

Texto: Amauri Eugênio Jr.

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