Mostra Cria na Vila recebe selo de Direitos Humanos e Diversidade
A Mostra Cria na Vila foi reconhecida com o Selo de Direitos Humanos e Diversidade – 7ª Edição, na categoria Transversalidades


A Mostra Cria na Vila, iniciativa da área de Prática de Desenvolvimento Local da Fundação Tide Setubal, foi reconhecida com o Selo de Direitos Humanos e Diversidade – 7ª Edição, na categoria Transversalidades.
Concedido pela Prefeitura de São Paulo, o prêmio celebra projetos que integram múltiplas dimensões dos direitos humanos, como diversidade racial, economia criativa e combate ao racismo religioso.
Realizado no Galpão ZL, no Jardim Lapena, a mostra tornou-se um símbolo de resistência e potência cultural, mobilizando mais de 5 mil pessoas em 17 edições. Para a comunidade local, o selo não é apenas um reconhecimento: é a confirmação de que a cultura feita na quebrada é direito, voz e instrumento de equidade.
Cultura como direito: O legado que o Selo reforça
O reconhecimento da Mostra Cria na Vila coincide com um momento crucial para o bairro, situado na zona leste. Enquanto a região avança em visibilidade, como no caso da recente inauguração do CEI Jardim Lapena, o Selo de Direitos Humanos e Diversidade legitima demandas históricas.
“Precisamos de mais políticas públicas, mas já provamos que a quebrada não espera: ela cria”, defende Luck Vas, idealizador, proponente e líder do projeto Revoada Terapia.
Para Malu Gomes, analista de programas da Fundação Tide Setubal, a premiação é um convite à reflexão. “Cultura não é luxo, é direito. E o Cria na Vila mostra que, quando a periferia ocupa seu espaço, ela transforma realidades.”Com programação gratuita, a mostra segue em frente para comprovar que no Jardim Lapena a arte não só resiste – ela floresce.
Transversalidade em Ação: Arte, Economia e Resistência
Desde 2022, a Mostra Cria na Vila ocupa o Galpão ZL com programação plural: de rodas de samba a batalhas de TikTok, e de debates sobre funk a desfiles de moda inclusiva. Segundo Malu, a chave do projeto está na transversalidade. “Articulamos diversidade racial, economia criativa e combate ao racismo religioso em um mesmo evento. O evento Afrobrasilidades, por exemplo, promovido por Kelly Cristiane [empreendedora e integrante do GT de Economia Solidária do Jardim Lapena], não somente exalta a ancestralidade afro-brasileira, mas confronta também estereótipos sobre religiões de matriz africana”, explica.
A conexão entre cultura e economia local também é estratégica. Durante os eventos, feiras de empreendedorismo movimentam o comércio, enquanto oficinas profissionalizantes estimulam o protagonismo de mulheres e jovens. “Um morador vende seu artesanato aqui e reinveste na comunidade. É um ciclo que transforma desafios urbanos em oportunidades”, destaca Malu.
O Selo como reconhecimento de uma luta histórica
Para o Jardim Lapena, região marcada por altos níveis de vulnerabilidade social, o selo carrega um peso simbólico. “É a primeira vez que inscrevemos a Mostra Cria na Vila em uma premiação desse porte. O reconhecimento valida décadas de luta cultural periférica”, emociona-se Malu. O título reforça a importância de iniciativas que combatem estigmas, como o Revoada Terapia, evento que mistura funk, poesia e debates sobre racismo.
Luck Vas, idealizador do Revoada Terapia, ressalta esse aspecto. “O funk é a voz do jovem da quebrada, mas ainda é marginalizado. Esse Selo prova que nossa cultura é legítima e essencial.”
Nesse sentido, com temas como empreendedorismo periférico e masculinidade, o projeto já gerou renda para vendedores ambulantes e deu visibilidade a MCs. “Como o Charlie Brown Jr afirma, ‘o jovem no Brasil nunca é levado a sério’. Mas aqui fazemos a parada acontecer”, conclui.
Do pós-pandemia ao protagonismo: a Mostra Cria na Vila cultura periférica
O Cria na Vila nasceu em 2022 como resposta à sede de lazer e representação por parte da comunidade do Jardim Lapena no pós-pandemia. “Como os grandes centros culturais ficavam distantes, trouxemos a arte para o território”, explica Malu.
Desse modo, a iniciativa da área cultural do Galpão ZL reúne coletivos e iniciativas como Afrobrasilidades, Moda Estética Favela e Entre Becos e Vielas para desenhar políticas culturais comunitárias.
“A mostra é feita pela e para a comunidade”, define Luck Vas. Um exemplo é o Moda Estética Favela, que em 2023 reuniu 678 pessoas em um desfile com cadeirantes e crianças do Jardim Lapena. “Muitos nunca haviam se visto em um palco. O projeto é sobre autoestima e quebra de invisibilidade”, completa.

Imagem da plateia do evento Revoada Terapia, que faz parte da Mostra Cria na Vila (Foto: Marcos Morais)
Jardim Lapena: território de potência em números
Com 12 mil habitantes, o Jardim Lapena enfrenta, então, desafios como baixa renda (29,6% dos domicílios vivem com até meio salário mínimo) e infraestrutura deficitária.
Mas os números escondem uma realidade: 20% da população do bairro é jovem e o vigor cultural é herança de décadas. Desde os anos 1970, São Miguel Paulista é um polo de cultura periférica – e a Mostra Cria na Vila atualiza essa tradição.
“Aqui, celebramos a resistência indígena, nordestina e negra que moldou o território”, afirma Malu. Para ela, “o Galpão ZL é mais do que um espaço: é um laboratório de equidade.
“Quando um haitiano como Chilo B.O.Y faz um show aqui, ou quando o sambista Dida une funk e pagode, estamos dizendo: a periferia é diversa, criativa e dona de seu futuro”, finaliza Malu Gomes.
Por Daniel Cerqueira