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Sobre territórios de direitos e protagonismo político da população

Programas de influência

26 de março de 2024
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Um dos aspectos centrais da atuação territorial da Fundação Tide Setubal, em particular no que diz respeito à promoção do protagonismo político da população das periferias, consiste em reforçar investimentos em ações para construir espaços de escuta e mobilização nesses mesmos territórios.

 

Essa lógica explica-se por esses locais deverem funcionar como promotores da vivência da cidadania, valorizando práticas diversas em âmbitos político, cultural, econômico e sociais, por exemplo, para que apoiem tais territórios no caminho de fortalecimento de sua identidade política. Idem quanto ao senso de pertencimento e criação de vínculos simbólicos e afetivos, potencializando a ação coletiva e a formação de lideranças políticas e culturais locais.

 

A mobilização e o protagonismo político da população nos territórios têm papeís fundamentais para criar novos processos de participação política para além de períodos eleitorais. Para Uvanderson Vitor da Silva, coordenador do Programa Democracia e Cidadania da Fundação Tide Setubal, pessoas tendem a engajar-se mais quando as pautas em discussão contemplam melhorias nas condições de vida das famílias e de onde vivem.

 

“O sucesso da participação política e da mobilização territorial está diretamente ligados à possibilidade de diálogo direto e efetivo com o poder público, para propostas da população tornarem-se políticas públicas. A população tende a participar mais quando processos participativos transformam vidas e se tornam ações concretas nos territórios”, explica.

 

Atuação multidisciplinar

 

A busca pelo protagonismo político da população de territórios periféricos na luta pela garantia de direitos contempla a atuação multissetorial. A partir de diagnósticos realizados pela equipe que está à frente do Plano de Bairro do Jardim Lapena, criou-se então uma série de grupos de trabalho (GTs). Os grupos atuam com os seguintes temas:

 

 

  1. Meio Ambiente e Sustentabilidade;
  2. Cultura;
  3. Economia Solidária;
  4. Reurbanização do Baixo Lapena;
  5. Infraestrutura;
  6. Imigrantes;
  7. Juventude.

 

A relevância na atuação dos GTs e do Plano de Bairro do Jardim Lapena é visível por tratar-se de movimentos que ajudam a descentralizar o poder decisório. Ao romper com a lógica segundo a qual melhorias territoriais aconteciam somente após decisões do poder público, tais grupos mostram que a população pode decidir. Logo, é fundamental ouvir habitantes dos espaços em questão.

 

“Quem vive a realidade no território sabe realmente quais são as necessidades e o quanto algo impactará negativa ou positivamente no território”, destaca Andrelissa Ruiz, coordenadora de Prática Local da Fundação Tide Setubal. “O Plano de Bairro e os GTs trazem olhar aprofundado e propositivo de quem vive no território e muito propositivo. Não é um movimento de reclamação, mas sim de proposição sobre o que se deseja, entendendo o que é possível e fazendo com que elas sejam ouvidas. O Plano de Bairro tem espaço para encaminhá-las para chegar ao poder público.”

 

Desse modo, outro ponto sobre os GTs diz respeito à energia comunitária. Ou seja, ao trazer transformações territoriais para além da incidência política e do poder público, mostra-se a potência da população para alcançar as transformações necessárias. “Isso agiliza muitas melhorias no território e é um elemento que motiva mais a participação das pessoas, pois elas realmente veem transformação”, pondera Andrelissa.

 

 

+ Engajamento político para se fazer ouvir e ter direito de decidir

 

Trabalhar pelo bem-estar comunitário

 

A afroempreendedora Kelly Cristiane, integrante do GT de Economia Solidária, destaca como falar sobre política no território ainda é algo visto como tabu. Mesmo que as lutas cotidianas para fazer valer os direitos a população. “Grande parcela das pessoas, infelizmente, não sabe diferenciar políticas públicas de políticas partidárias”, comenta. Mas, no outro extremo, a mobilização por meio do Plano de Bairro do Jardim Lapena tem permitido, enfim, o engajamento de mais pessoas no cotidiano político no território a partir dos GTs.

 

Algumas iniciativas do GT de Economia Solidária, especificamente, consistem em mentorias coletivas em formatos de rodas de conversas para trocas de experiências entre as pessoas envolvidas. “As ações desenvolvidas têm tido ótimos resultados, principalmente nas formações de redes e mentorias entre os empreendedores. Isso os faz entender que não é necessário ser concorrentes, mas sim aliados. Idem que podem se aliar e se fortalecer para o crescimento e desenvolvimento econômico de nosso território.”

 

Além do aumento da interação com comerciantes e pessoas empreendedoras do bairro, o “olhar ainda mais carinhoso com o Lapena”, como ela mesma diz, abrange também de outros projetos dos quais participa. Nesse sentido, um deles é o grupo Guardiãs do Território.

 

As Guardiãs do Território, cujo trabalho contempla uma série de iniciativas em favor do bem-estar do bairro, têm também como foco mostrar para a população do território que melhorias vêm, então, por meio de políticas públicas. Idem para fomentar o protagonismo político da população. “Por meio da união do Plano de Bairro e das Guardiãs do Território, a população percebeu cada dia mais a chegada de melhorias. Isso foi e está motivando mais pessoas a lutar junto conosco”, destacam as guardiãs, cujo grupo conta com mais de 200 integrantes. “Estamos sentindo que cada dia mais somos uma força importante no nosso bairro.”

 

“Trabalhamos em coletivo e nos envolvemos em todo o corpo da comunidade”

 

A busca por informações que pudessem empoderar racialmente a filha, que à época sofria ataques de cunho racista na escola, levou Maria Edilene Guimarães Roque, moradora do Jardim Lapena, a uma trilha que culminou no seu ingresso no GT de Meio Ambiente e Sustentabilidade do bairro.

 

“Alguém me falou sobre o Ponto de Leitura do Jardim Lapena, mas não havia atendimento presencial”, descreve. Vale destacar que isso ocorreu em virtude do distanciamento social então vigente por causa da pandemia de Covid-19. “Mas, naquele dia, contei a situação pela qual estava passando e Malu [Gomes, responsável pelo Ponto de Leitura] me recomendou a ler sobre identidade africana. Isso para ajudar minha filha a se sentir melhor e se reconhecer.”

 

Esse foi, então, um ponto de virada. “O Ponto de Leitura foi o começo de toda a minha paixão e por meio do qual comecei a participar de reuniões do Plano de Bairro e de cursos que aconteciam lá. E surgiu a oportunidade de entrar no GT”, comenta.

 

Nesse sentido, a relação de Edilene com o GT de Meio Ambiente e Sustentabilidade dialoga também com uma experiência ao seu ingresso no grupo. No caso, a criação de uma horta próxima à sua casa, em um terreno pertencente a uma empresa. “Havia um lixão onde as pessoas descartavam o lixo de todo o território. Eu e meu esposo decidimos limpar o terreno para fazer alguma coisa. E começamos a plantar folhas para chás.” Apesar da intenção nobre da iniciativa, por meio da qual ela dava folhas de chás para moradoras e moradores em troca de eles não jogarem resíduos no espaço, funcionários da empresa derrubaram a plantação por algumas vezes. Isso até ambas as partes, enfim, entrarem em acordo.

 

Assim sendo, essa experiência, mesmo sem saber à época, foi uma peça fundamental, aliada à sua graduação em Pedagogia, para o seu ingresso no GT. Idem no seu trabalho, por meio do grupo, na implementação de hortas e compostagem nas escolas em funcionamento no bairro. O trabalho é, então, feito em conjunto com as Guardiãs do Território.

 

Isso tudo, por fim, a fez se sentir mais próxima do bairro. “Trabalhamos em coletivo, mas acabamos nos envolvendo em todo o corpo da comunidade. Abraçamos aquela parte em que falamos que nós somos lideranças. Quando falamos isso, é sobre cuidarmos um do outro.”

 

 

Saiba mais

+ Territórios de Direitos: um guia para construir um Plano de Bairro com base na experiência do Jardim Lapena

 

+ (Re)distribuição Territorial do Orçamento Público: Uma Proposta para Virar o Jogo das Desigualdades

 

 

 

Texto Amauri Eugênio Jr.


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