Por que apoiar a formação de lideranças negras é fundamental para a construção de um futuro melhor para a sociedade?
Entenda por que a formação de lideranças negras é estratégica para a promoção da equidade racial em todos os segmentos sociais


Apoiar a formação de lideranças negras, seja em âmbito pessoal ou profissional, é fundamental quando se fala no enfrentamento das desigualdades. Estudos e evidências não deixam mentir: por um lado, a sub-representação de lideranças negras em postos para gestão nas esferas privada e pública retroalimenta disparidades sociorraciais. Já por outro lado, fatores como pluralidade de ideias, vivências e perspectivas diferentes ampliam a capacidade de se encontrar soluções criativas e efetivas.
Além disso, a edição 2023 do relatório Diversity Matters (A Diversidade Importa), da McKinsey, mostra que empresas que aplicavam parâmetros de diversidade, equidade e inclusão em suas respectivas estruturas eram 39% mais propensas a ter melhor desempenho financeiro em comparação com outras organizações.
Ou seja: além da parte mercadológica e financeira, pode-se considerar que o apoio à formação de pessoas negras reflete-se também na formulação de políticas públicas para enfrentar desigualdades.
No entanto, ações que objetivam promover diversidade, equidade e inclusão têm sofrido ataques sistemáticos mais intensos, de autoria de segmentos sociais reacionários, sob a justificativa de valorização do mérito. Por trás desse argumento está a tentativa de interditar a ascensão profissional – e pessoal – de mulheres, pessoas negras e de demais grupos minorizados. As veementes – e até mesmo risíveis e anedóticas – ofensivas com esse teor por parte do segundo mandato de Donald Trump na presidência dos EUA são didáticas.
Sobre comportamentos e formação
Segundo Janine Rodrigues, psicanalista, escritora e fundadora da Piraporiando, organização voltada à promoção de educação antirracista e de ações para promoção de diversidade e inclusão em empresas e escolas, uma parcela populacional considera ainda que o grupo do qual faz parte é referência de qualidade e saber, enquanto a função de pessoas negras é servi-la e atuar como suporte para o seu crescimento.
“Por exemplo, uma pessoa branca pode ouvir um profissional negro? Essa escuta é de qual tipo quando acontece? Ouve-se um sujeito, detentor de saber, de direitos, detentor de subjetividades, ou uma coisa? Ou se ouve um prestador de serviço? Ou, até mesmo, ouve-se um corpo que não tem nenhuma validade na sua história e cultura?”, pergunta Janine.
Nesse sentido, um exemplo diz respeito a dúvidas sobre a capacidade de uma pessoa profissional negra uma vez que o seu conhecimento e base intelectual são colocados em xeque. Isso reflete-se, inclusive, na quantidade de docentes e gestores negras e negros em escolas e institucos de educação tradicionais.
Desse modo, outra dimensão estratégica na formação de lideranças negras transcende o desenvolvimento de pessoas desse grupo sociorracial para superar a sua sub-representação em postos estratégicos – passando por empresas e escolas, por exemplo. O que está em jogo é a formação de sujeitos e, consequentemente, pelo ambiente escolar.
“Quando estou na escola, como construo, no meu imaginário, o lugar da pessoa negra na sociedade? Se eu tiver essa construção do imaginário, ao ser permeada por pessoas negras e não negras, e quando chego a uma empresa e vejo que os meus colegas, o meu líder e o diretor da empresa são são brancos assim como o conselho, mas se vivi a experiência de um lugar plural, esse cenário, isso [o ambiente homogêneo] me causará estranhamento”, pondera a fundadora da Piraporiando.
+ Confira a entrevista com Janine Rodrigues
Pluralidade e formação
Para além da perspectiva profissional, a formação de lideranças negras tem, sim, relação intrínseca com o ambiente escolar. Isso porque o contato com grupos plurais desde os primeiros anos da formação de sujeitos resultará no desenvolvimento de pessoas que tratarão a diversidade, a equidade e a inclusão como aspectos mandatórios e constitutivos da organização social.
Consequentemente, um espaço hegemônico ou exclusivamente composto por pessoas de um determinado segmento sociorracial causará estranheza. E, com isso, será lido como o signo da reprodução de vieses e de exclusão de outros grupos.
Por fim, a sociedade civil, inclusive fundações, empresas, OSCs e o ISP, assim como o Estado, precisam reforçar o papel da escola como um espaço estratégico nesse contexto. Isso porque, afinal, essa etapa tem papel fundamental para a formação de lideranças negras. Inclusive, essa lógica tem papel fundamental quando se fala na formação de ambientes inclusivos e seguros para que elas possam estudar sem ser alvos de episódios e comportamentos de cunho racista.
“Quem está trabalhando nas agendas de equidade racial e de luta antirracista precisa olhar deuma maneira muito significativa para o que acontece nas escolas. Senão, quando se chegar em empresas na idade adulta, quando os problemas ganham proporção e visibilidade maiores, será muito difícil haver mudança expressiva”, completa Janine Rodrigues.
Texto: Amauri Eugênio Jr.