Três fatores importantes para a regionalização do orçamento e os desafios para implementá-lo
Por Daniel Cerqueira / Fotos: Léu Britto / DiCampana Foto Coletivo O debate sobre orçamento público tende a ser muito técnico e de difícil entendimento por grande parte da população. Para romper com essa lógica é necessário criar mecanismos que aproximem a cidadania da administração pública. Este foi um dos pontos tratados no debate Para Onde […]
Por Daniel Cerqueira / Fotos: Léu Britto / DiCampana Foto Coletivo
O debate sobre orçamento público tende a ser muito técnico e de difícil entendimento por grande parte da população. Para romper com essa lógica é necessário criar mecanismos que aproximem a cidadania da administração pública. Este foi um dos pontos tratados no debate Para Onde Vai o Dinheiro? Gastos Públicos nas Grandes Cidades, realizado pela Fundação Tide Setubal em 13 de novembro, na Biblioteca Alceu Amoroso Lima, em Pinheiros.
A Fundação tem se dedicado nos últimos anos à questão da territorialização ou regionalização do orçamento. Começou em 2018, com o lançamento do estudo Gasto Público no Território e o Território do Gasto nas Políticas Públicas, realizado por Tomás Wissenbach, doutorando em Administração Pública e Governo pela FGV-SP e que, agora, atualizou as informações por meio da publicação A Dimensão Territorial do Orçamento Público: Orientações para Regionalização do Gasto nas Cidades Brasileiras, e criou o Indicador de Regionalização do Orçamento, centrado na execução orçamentária.
O indicador apresentado no evento é uma maneira de identificar o percentual do investimento público que tem a sua localização informada. “A regionalização é importante por três aspectos: para reduzir as desigualdades, aumentar a participação social e facilitar o planejamento governamental”, conta Tomás.
Tomás Wissenbach (Léu Britto / DiCampana Foto Coletivo)
Reduzir ou enfrentar as desigualdades, com destaque para o fortalecimento das periferias, é um dos pilares da missão da Fundação Tide Setubal. A superintendente Mariana Almeida lembra que o conhecimento adquirido pela instituição no território de São Miguel possibilita estes novos desafios de olhar não somente para uma região, mas para toda a cidade. Almeida completa dizendo que “é importante olharmos para a regionalização como uma ferramenta potente desse enfrentamento.”
Outro dado trazido ao público durante o encontro foi o estudo Regionalização do Orçamento em Grandes Cidades, realizado por Pedro Marin, doutor em Administração Pública e Governo pela FGV-SP, que tratou de compreender como a dimensão territorial do gasto é considerada em Montreal, Paris, Madri, Buenos Aires, Londres, São Paulo e Cidade do México, além de investigar os processos participativos no orçamento e a inovação para a regionalização.
Handemba Mutana (Léu Britto / DiCampana Foto Coletivo)
Um consenso entre o grupo presente era o de que a regionalização possibilita a participação da cidadania nos processos decisórios do orçamento público. Handemba Mutana, coordenador de Advocacy e Políticas Públicas da Fundação Tide Setubal, lembra que “dimensionar o orçamento regionalizado é importante para compreender e mensurar como se gasta e para facilitar a participação da cidadania nos debates sobre o tema.”
Detalhando os conhecimentos adquiridos
Os estudos realizados ao longo destes dois anos estão sendo publicados em diversas ocasiões pela Fundação Tide Setubal. É possível baixar os dois de Tomás Wissenbach: “Gasto público no território e o território do gasto nas políticas públicas” e “A dimensão territorial do orçamento público: orientações para regionalização do gasto nas cidades brasileiras”.
Os leitores poderão conferir, no site da Fundação Tide Setubal, as entrevistas com Tomás Wissenbach e Pedro Marin para entender melhor o que cada um descobriu nesse período.
Pedro Marin (Léu Britto / DiCampana Foto Coletivo)
Ampliar o debate para fomentar uma ideia
A segunda parte do evento na biblioteca Alceu Amoroso Lima contou com uma mesa na qual dialogaram Laura Carvalho, professora livre docente do Departamento de Economia da FEA-USP e doutora em economia pela The New School for Social Research de Nova York; Fabiano Martins de Oliveira, auditor fiscal tributário, subsecretário de Planejamento e Orçamento da Secretaria Municipal da Fazenda de São Paulo; Cilair Rodrigues de Abreu, doutor em administração pública pela Universidade de Brasília (UnB), coordenador-geral de Orçamento e Finanças da Escola Nacional de Administração Pública (Enap). A moderadora foi Gabriela Mendes Chaves, economista, mestranda em Economia Política Mundial pela UFABC e fundadora da NoFront – Empoderamento Financeiro, plataforma de educação financeira voltada à comunidade negra.
Para Laura, “a questão do enfrentamento das desigualdades é crucial para a volta do crescimento brasileiro”. A economista acredita que o orçamento público está amarrado a regras rígidas que aparentam dar maior controle social sobre ele, mas que, ao final, “têm tirado investimento nos mais pobres ao invés de garantir uma transparência que garanta sua distribuição. Estas regras acabam por facilitar a pressão de quem já tem o poder econômico e que pode alcançar as questões técnicas orçamentárias.”
Laura Carvalho, Gabriela Mendes Chaves, Fabiano Martins de Oliveira, Cilair Rodrigues de Abreu e Mariana Almeida (Léu Britto / DiCampana Foto Coletivo)
Cilair Rodrigues atenta para o fato de que, por trás de um aparente debate técnico, a questão orçamentária é também uma questão política. “Todas as decisões implicam em ganhos e perdas para os territórios. E se ele diz respeito às pessoas que lá habitam, é preciso que elas entendam o que se passa para cobrarem e participarem.”
No que diz respeito à cidade de São Paulo, Fabiano Martins, subsecretário de Planejamento e Orçamento da prefeitura, avalia que para regionalizar o orçamento é preciso ainda um marco legal que indique para onde deve ir o investimento. “Ainda há uma dificuldade de verificar como fazer a regionalização do orçamento no planejamento e na execução porque, tecnicamente, é complexo localizar uma ação que, às vezes, tem mais de uma subprefeitura envolvida, por exemplo.”
Envolvidos por esta reflexão, convidadas, pesquisadores e público estavam de acordo com relação À importância da regionalização para reduzir as desigualdades, aumentar a participação social e facilitar o planejamento governamental, como disse Tomás. Ao mesmo tempo, eles estavam cientes de que este não é um processo simples e de que é necessário muito trabalho para alcançar na cidade os exemplos descobertos e apresentados pela pesquisa de Pedro Marin.