Analista de comunicação e produtor de conteúdo do site da Fundação Tide Setubal
Como o terceiro setor pode ser aliado na formação de lideranças negras?
Quando se fala em promoção da equidade, a formação de profissionais negras e negros para ocupar postos de poder e de decisão, inclusive na esfera pública, é mandatória. Nesse sentido, o terceiro setor pode ser aliado na formação de lideranças negras para reduzir a sub-representação em tais espaços.
Quando se fala em promoção da equidade, a formação de profissionais negras e negros para ocupar postos de poder e de decisão, inclusive na esfera pública, é mandatória. Nesse sentido, o terceiro setor pode ser aliado na formação de lideranças negras para reduzir a sub-representação em tais espaços.
O Observatório de Pessoal, do Governo Federal, estima que elas correspondam a 36% do serviço público. Ainda, um levantamento da organização República.org apontou menos de 15% dos cargos de Direção e Assessoramento (DAS) na escala hierárquica mais alta – DAS-6 – correspondem a pessoas negras. E, quando a intersecção de raça e gênero entra na equação, mulheres negras correspondem a somente 1,2% dos postos DAS-6.
Para Delton Aparecido Felipe, professor da Universidade Estadual de Maringá (UEM), secretário executivo da Associação Brasileira de Pesquisadores Negros (ABPN) e pesquisador visitante da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas São Paulo (FGV Direito SP), ainda que políticas afirmativas, como a Lei de Cotas e a Lei 12.990/2014, que prevê reserva de 20% de vagas em concursos públicos para pessoas que se autodeclaram negras, contribuam para mais pessoas negras estarem no funcionalismo público, mais ações são necessárias para haver de fato equidade sociorracial e de gênero nesse contexto. Desse modo, o terceiro setor pode ser aliado na formação de lideranças negras.
Nesse contexto, um dos atributos que evidenciam a disparidade sociorracial em processos para seleção de lideranças abrange a exigência de atributos como a realização de intercâmbio ou fluência em outro idioma para vagas afirmativas. Como parâmetro, apenas 1% da população brasileira tem fluência em língua inglesa. “Por muitas vezes, não é possível encontrar a pessoa profissional com o perfil [que se deseja]. Percebe-se que isso tem a ver com a exigência de um aspecto ao qual boa parte da população negra está lutando para chegar”, destaca Delton.
Sobre contextos e ações necessárias
Quando se fala em atributos relativos a vagas em postos de liderança, inclusive afirmativas, exigências como intercâmbio e fluência em língua estrangeira são fatores impeditivos. Assim sendo, passar a não exigi-los e, consequentemente, revisar a real necessidade inerente a eles não significa reduzir a qualidade profissional. Trata-se, no caso, de analisar como outros fatores tão importantes quanto esses, mas são subestimados por vieses de ordem social – e, consequentemente, racial.
“Não falo de baixar a régua: falo de entender mesmo sobre o que se precisa ou se determinada certificação será necessária para o dia a dia da profissional”, destaca Amanda Abreu, cofundadora da Indique uma Preta, consultoria especializada em diversidade e inclusão racial no mercado de trabalho.
Amanda Abreu destaca também a necessidade de organizações adotarem medidas para contratar pessoas de grupos minorizados e, consequentemente, mantê-las em suas estruturas. “Durante anos, pessoas pretas, LGBTQIAP+, PCDs ou indígenas se modificaram para entrar no mercado de trabalho. Mulheres negras modificam seus cabelos – não respeitam a sua estética identitária para ela entrar no mercado de trabalho. Agora é a hora de o mercado de trabalho entender um pouquinho que ele precisa se modificar para acolher essas pessoas. Senão, ele ficará muito atrás do que acontece no mundo.”
Viviane Soranso, coordenadora do Programa Lideranças Negras e Oportunidades de Acesso da Fundação Tide Setubal, fala da necessidade de mudar parâmetros nesse contexto. “Profissionais de recrutamento precisam se questionar e rever critérios estabelecidos para as contratações, de modo a observar e enfrentar o racismo que opera dentro das instituições e empresas.”
Sobre o protagonismo do terceiro setor
Em paralelo, pode-se dizer, desse modo, que o terceiro setor pode ser aliado na formação de lideranças negras em paralelo. Uma das ações nesse sentido é a Plataforma Alas. Essa iniciativa visa apoiar o desenvolvimento de profissionais com esse perfil para chegar a espaços de poder e de decisão.
Assim sendo, Viviane Soranso aponta para a desigualdade sociorracial existente no Brasil e como retroalimenta disparidades entre as populações negra e branca. Idem para a necessidade de diversos entes envolverem-se em iniciativas para combatê-la, inclusive para o modo como o terceiro setor pode ser aliado na formação de lideranças negras.
“Pesquisas apontam que grupos não minorizados em direitos sociais possuem acesso a diferentes possibilidades durante toda a sua trajetória de vida, contribuindo para sua mobilidade social e ascensão. Assim sendo, precisamos nos atentar para as desigualdades sociais com as quais esses grupos lidam desde a sua mais tenra idade. As políticas públicas e as instituições investidoras devem garantir apoios de forma mais contínua e menos a curto prazo”, ressalta.
Por fim, Delton Aparecido Felipe fala sobre como a sociedade civil pode apoiar lideranças negras para chegar a espaços de decisão do poder público. “A sociedade civil tem um papel significativo para promover o aprimoramento dessas pessoas. Por fim, tem papel maior ainda para conquistar espaços ou colaborar e, desse modo, gerar formas dessas populações conquistarem, chegarem e permanecerem nesses espaços.”
Texto: Amauri Eugênio Jr. / Foto: @WOCInTech