Arraial do CDC Tide Setubal difunde cultura popular em São Miguel Paulista
Congadas,catira,samba rural e forró animaram o público, que conheceu a diversidade cultural brasileira
Pelo quarto ano consecutivo, a Fundação Tide Setubal promoveu o Encontro de Cultura Caipira, no CDC Tide Setubal, em São Miguel Paulista, zona leste da cidade de São Paulo. No fim de semana de 18 a 20 de junho, 6.144 pessoas de diferentes idades, em família ou em grupos de amigos, festejaram as tradições do interior do Brasil. Congadas, grupos de catira, dança de fita, samba rural e forró animaram o público, que conheceu expressões da diversidade cultural brasileira.
Nesta edição, o tema foi o café do Brasil, fazendo alusão ao baronato cafeeiro, que trouxe riquezas para uma metrópole que pouco a pouco se agigantou. “Buscamos todos os anos temas que dialogam com a cidade”, relata Tião Soares, coordenador de cultura da Fundação. “Além do componente histórico, a festa resgata faz parte de uma política de cidadania. E, por mais que as pessoas não conheçam os grupos, elas passam a se acostumar com a diversidade, chegando até a participar dos cortejos, por exemplo”, conta Tião.
Um dos destaques da programação deste ano foi a intervenção de três congadas — de Nossa Senhora do Rosário, de São Benedito e de Santa Ifigênia na Praça do Forró, no centro de São Miguel Paulista, no sábado à tarde. Os grupos se apresentaram, convidando o público para participar da festa no CDC. “Foi um sucesso”, comenta Tião. Quem passava pelos arredores da praça, parava para olhar, e alguns acompanhavam o cortejo, prestando atenção no ritmo da percussão e no bailado dos integrantes. À noite, no CDC, cada coletivo fez sua apresentação, mostrando danças como caracol e cruzeiro. Houve ainda um momento em que as três congadas se reuniram para dançar e cantar.
Débora Ganini, moradora de São Miguel Paulista, frequentadora do Encontro desde a primeira edição em 2007, dançou ao som da percussão das congadas. “Eu adoro. A congada fala muito da gente. Quando bate o tambor lá, bate o coração aqui. Acho que é da terra, faz parte da nossa cultura”. Para Gislaine Afonso, capitã da Congada Santa Ifigênia e única mestre mulher a comandar um grupo de congada no estado de São Paulo, o Encontro de Cultura Caipira, do qual participa há quatro anos, é um ótimo espaço para divulgação do trabalho do grupo. “Podemos mostrar a dança de origem africana e os ritmos. Assim, as pessoas passam a dar mais valor às congadas, aos moçambiques”.
Show de sanfonas e samba
Outro ponto alto da festa aconteceu no domingo durante a apresentação da Orquestra Sanfônica de São Paulo. O público formou uma grande roda, espontaneamente, e criou ali mesmo sua própria quadrilha. Em seguida, as pessoas foram formando pares para bailarem ao som dos clássicos do repertório brasileiro de música popular, tocados por dezenas de sanfoneiros. Um dos casais mais animados era Helenimar Pereira Xavier e Adelson Aparecido dos Santos. Moradores de Cidade Nova São Miguel, eles já conheciam a festa desde a primeira edição e decidiram neste ano apenas passar para tomar um quentão, mas acabaram caindo na dança.“A orquestra é muito animada. Não tem como não dançar”, disse Helenimar, que também apreciou muito o samba de Pirapora. “Nunca tinha visto esse tipo de samba. Gostei bastante e fui ficando mais para ver as outras atrações”, conta.
O grupo Samba de Pirapora mostrou o samba de bumbo, que teve sua origem na cidade de Pirapora do Bom Jesus, considerada o berço do samba paulista. Na apresentação, os homens tocavam percussão e as mulheres dançavam e cantavam. Alguns cantos lembravam a embolada, com os versos feitos no improviso. Também animaram o Arraial do CDC os grupos: Trio Rastapé Flor de Muçambê, Grupo de Catira de Suzano, Grupo Jabuticaqui – Ritmo e Tradição, Banda Semente Africana/Família da Nova e Grupo Cultural Itapoá – Dança das Fitas de Ubatuba.
A programação musical recebeu elogios da nova geração. A adolescente Talita da Silva, 15 anos, moradora de São Miguel Paulista, ficou surpresa com as atrações “É a primeira vez que venho no Arraial. Tem bastante coisa diferente das outras festas. Eu vi as congadas, achei interessante, diferente. É legal porque aprendi um pouco mais. Dá para conhecer como as coisas eram antes e como são agora”, conta.
Viagem por sabores e cores
Seguindo a tradição da festa, as comidas do Arraial valorizaram as receitas da culinária do interior. Na barraca do Programa Ação Família havia uma vasta oferta de quitutes: bolos de mandioca com carne seca, de fubá cremoso, de mandioca com coco, de milho com coco e de milho verde, além de caldinhos de feijão e de mandioca, cocada, cuscuz paulista, maçã do amor e pipoca.
As iguarias foram preparadas pelas mulheres que participaram de curso de pratos de Festa Junina na Oficina Escola de Culinária. Edna Luiza Santana, 53, aposentada, moradora de São Miguel Paulista, esteve envolvida no preparo de todos os pratos. “Não fiz um em especial porque fiquei picando ingredientes para todos eles”, relatou a mineira de Diamantina. No domingo, enquanto suas netas dançavam na quadrilha do Clube Escola, a avó cuidava da barraca, ao lado de outras seis mulheres do Ação Família. “Tenho a intenção de começar a vender as comidas que aprendi a fazer. Mas ainda preciso me organizar”. Mesmo assim, comemorou as ótimas vendas da festa: “Já é um dinheirinho”.
Cultura popular e memória
Com a intenção de arrecadar fundos para o Centro de Educação Infantil Golfinho Dourado, da Associação Amigos de Bairro da Cidade Nova São Miguel, Alessandra Valério, diretora da creche, resolveu participar das reuniões para organizar uma barraca de jogos (pescaria e argolas) no Arraial do CDC. Ao ser selecionada, ficou contente com a participação na festa, sobretudo após notar o cuidado com a programação e a decoração. “Se a barraca não der o lucro que preciso, tudo bem. Já valeu pelo aprendizado, principalmente, de cultura popular. Muitas vezes, esquecemos as nossas origens. Quero levar o que aprendi aqui para outras professoras”.
Como Alessandra, outros moradores de São Miguel destacaram os novos conhecimentos e suas lembranças. Juliana Vicchino ficou encantada com a Casa Caipira do CDC, feita de pau-a-pique e sapê e com móveis e utensílios típicos do homem do interior. “É demais. Você entra na realidade deles”. Para Daiana Moura, a visita à casinha fez lembrar das histórias da mãe, que viveu em Pernambuco. Já a fogueira, as bandeirinhas, os balões trouxeram para Maria Ana da Conceição Guimarães, 68 anos, moradora do Itaim Paulista, as lembranças das festas das quais participava no sertão pernambucano. “Estou aqui há 14 anos, mas sinto falta de lá”.
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