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Empreendedorismo sem romantismo

Texto e fotos: Amauri Eugênio Jr.

 

 

O nível de desemprego no Brasil faz diversos profissionais que estão fora do mercado de trabalho procurar por saídas para tocar a vida e conseguir, ao menos, pagar as contas. Segundo dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a taxa de desemprego no país é de 11,8% – ou seja, 12,5 milhões de pessoas estão desempregadas. Ainda dentro desse cenário, outra pesquisa, feita pela GEM (Global Entrepreneurship Monitor), apontou que a taxa de empreendedorismo total no Brasil chegou a 38%, segundo a qual cerca de 52 milhões de brasileiros têm um negócio próprio.

 

Contudo, algumas ressalvas devem ser feitas neste caso. Segundo o IBGE, o país tem 38,8 milhões de pessoas alocadas em trabalhos informais – dentro desse cenário, 11,8 milhões trabalham sem registro em carteira no setor privado e 19,4 milhões não têm CNPJ e trabalham por conta própria, enquanto os demais trabalham no setor público ou são trabalhadores domésticos.

 

Foi com base no panorama do trabalho via empreendedorismo, mas sem romantizá-lo, que a jornalista, empreendedora e curadora de conteúdo Monique Evelle participou de bate-papo com jovens do Jardim Lapena no Galpão ZL. A atividade, realizada durante o Festival do Livro e da Literatura de São Miguel, foi marcado também pelo lançamento de seu livro, Empreendedorismo Feminino: Olhar Estratégico Sem Romantismo.

 

Durante a conversa com os adolescentes e jovens adultos, Evelle falou sobre a sua trajetória profissional, como a infância e a adolescência em Salvador (BA) foram determinantes para a sua formação, e sobre empreendedorismo.

 

Monique Evelle (à direita) fala sobre empreendedorismo (Amauri Eugênio Jr.)

 

Após o evento, a empreendedora conversou com a equipe da Fundação Tide Setubal sobre a sua obra e os assuntos abordados durante o papo com o público. Logo de cara, Evelle falou sobre a necessidade de desconstruir a narrativa em favor da meritocracia. “Ninguém saiu da linha de partida no mesmo momento, com as mesmas ferramentas e as mesmas oportunidades na hora da corrida”, destacou, enquanto falava sobre a linha tênue existente entre comemorar as conquistas e os esforços individuais sem usá-los como exemplos aplicáveis para todos os que vivem no mesmo contexto. “É importante valorizar [isso], sobretudo com pessoas que nasceram na quebrada, mulheres, pessoas LGBT e negras, quando conseguem alcançar um determinado espaço. O problema surge quando esse discurso é usado para massificar a nossa trajetória, o que dá margem para achar que todo o mundo está no mesmo barco e na mesma trajetória – mas não está.”

 

A crítica de Monique ao uso do esforço de uma pessoa como exemplo para medir as trajetórias de todos que estão ao seu redor é justificada pela premissa relativa ao termo meritocracia, cujo uso tem se intensificado faz alguns anos. Essa expressão, segundo o qual cada pessoa pode ascender apenas com base no próprio esforço, surgiu como uma crítica satírica feita no livro A Ascensão da Meritocracia (The Rise of the Meritocracy), escrito pelo sociólogo e político britânico Michael Young. A obra descreve uma sociedade na qual uma elite se consolida com base em resultados de testes de QI em que apenas quem teve acesso a ensino de boa qualidade se destaca.

 

Empreendedorismo Feminino: Olhar Estratégico Sem Romantismo, livro de Monique Evelle (Amauri Eugênio Jr.)

 

 

Escrevendo sobre a sua trajetória

 

“Eu precisava registrar este momento: os meus aprendizados até aqui, aos 25 anos, o que entendi deste mercado e o que posso sugerir para outras pessoas – compartilho e dicas, ferramentas.” É deste modo como Monique Evelle descreve o seu livro, no qual visa promover reflexão sobre como é a gestão de um negócio e quais benefícios poderá promover para quem estiver ao redor.

 

Durante a entrevista, Evelle falou também sobre outro aspecto cujo papel foi superimportante para a sua trajetória profissional e que transcende o empreendedorismo: o direito à cidade, conceito criado pelo filósofo Henri Lefebvre, segundo o qual, em resumo, todos os cidadãos têm direito de aproveitar o cotidiano e os espaços da cidade de modo pleno, sem barreiras de classe, raça e demais variáveis. “Tive um direito tão fundamental, que virou a [minha] chave, que foi o direito à cidade. Sempre circulei em todos os lugares de Salvador e entendi várias realidades, e isso me fez criar coisas o tempo todo.”

 

A vivência de quem viveu em território periférico, mas pôde aproveitar os espaços de Salvador de modo pleno, fez Monique ver o mundo além de barreiras sociais a ponto de o potencial criativo e potente dela a levou a descobrir-se empreendedora como passar do tempo. E a sua vivência a possibilitou passar para o seu livro a sua visão sobre empreendedorismo – sem rodeios e sem mostrar o lado idealizado do dia a dia de um empreendedor. “Eu o escrevi e não o alterei depois. Se o tivesse feito, teria se tornado outro livro, pois não é o mesmo que Monique finalizou em um momento X. Falo algumas coisas que talvez não sejam tão agradáveis para alguns empreendedores e empreendedoras, sobretudo. Mas isso é necessário, pois todos os livros de empreendedores são de autoajuda – e o meu não é de autoajuda”, finaliza.

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