Analista de comunicação e produtor de conteúdo do site da Fundação Tide Setubal
Desatar os nós para implementar políticas públicas em periferias
A atividade 'Implementação de políticas públicas em periferias: desatando os nós', que aconteceu durante a Semana de Inovação 2024, da Enap, colocou em pauta a articulação com o poder público para a atuação em territórios periféricos
A implementação de políticas públicas em periferias deu o tom do envolvimento da Fundação Tide Setubal durante a Semana da Inovação 2024, da Escola Nacional de Administração Pública (Enap).
Por meio da atividade Implementação de políticas públicas em periferias: desatando os nós, pôde-se estabelecer diálogo com a plateia sobre ações para superar travas institucionais. Idem mostrar como a relação com o poder público pode ser mais propositiva nesse sentido e como engajar a população nesse contexto.
Desse modo, os tópicos norteadores do evento passaram por pontos das publicações Advocacy Colaborativo para o Investimento em Infraestrutura Urbana nas Periferias: Experiência do Jardim Lapena e O Fenômeno do Apagão das Canetas. Nesse cenário, o foco consistiu em mostrar iniciativas que tivessem como objetivo apontar novos caminhos para otimizar a implementação e a expansão de serviços públicos em territórios periféricos.
O território importa
Durante sua participação na atividade Implementação de políticas públicas em periferias: desatando os nós, Vânia Silva, analista de Programas e Projetos da Fundação Tide Setubal, destacou como o acesso à informação tem papel fundamental para estimular a participação popular.
Além disso, ela destacou o papel estratégico que a adoção de estratégias com esse perfil tem para decodificar termos técnicos. E, consequentemente, tornar conceitos caros ao funcionalismo público próximos à realidade das populações das periferias. “Quando ouviríamos falar em um plano diretor e pensaríamos esse território juntos para conversarmos com o poder público?”, pondera.
Vânia Silva reforçou como a comunicação é preponderante para engajar a população nesses mesmos processos. “Termos técnicos, como advocacy, não eram conhecidos e eram muito distantes da realidade das periferias. Primeiro, precisávamos entender e, depois, convencer a comunidade de que valia a pena lutar pela melhoria deste território.”
Essa mobilização descrita pela analista de programas e projetos da Fundação Tide Setubal culminou, inclusive, em iniciativas como o Plano de Bairro do Jardim Lapena, que apresentou propostas de melhorias a partir de demandas e propostas desenvolvidas pela população.
Essa lógica considerou, inclusive, as especificidades dos diversos territórios dentro do mesmo bairro, os quais apresentam índices mais severos de vulnerabilidade em comparação com outros. “Os próprios moradores, com a energia comunitária, começaram a incidir sobre esse território e perceber que era possível, sim – era preciso estar juntos.”
Precisamos falar sobre o advocacy colaborativo
Fabiana Tock, coordenadora do Programa Cidades e Desenvolvimento Urbano da Fundação, destacou durante a mesa Implementação de políticas públicas em periferias: desatando os nós, aspectos sobre o advocacy colaborativo. Para tanto, foi necessário abordar como essa estratégia objetivou contornar o descompasso da morosidade do poder público com a urgência de demandas das periferias.
Nesse sentido, uma dimensão anterior passou por colocar em prática as ações almejadas pela população por meio do Plano de Bairro. “Esse é um instrumento excelente para organizar e hierarquizar as demandas que uma comunidade periférica, em especial, tem em relação aos seus problemas urbanos. Melhor do que ninguém para falar dos seus problemas é quem os vive no dia a dia.”
A partir dessa premissa, questionou-se como seria possível unir o planejamento local, por meio do Plano de Bairro, ao que ocorreu em escala maior – no caso, municipal. “Foi isso o que tentamos problematizar a partir do momento em que vimos que o Plano de Bairro havia gerado todo esse movimento local. Mas não tinha conexão com as secretarias – não havia dotação orçamentária.”
Esse foi, então, o vetor para reflexão sobre maneiras para transformar os projetos previstos na sistematização dos pontos levantados pela população do Jardim Lapena, transformá-los em projetos básicos e doá-los para a Prefeitura implementar tais obras. Contudo, esse processo não era simples. “Para um projeto ganhar institucionalidade e tração política dentro da secretaria, há diversas costuras que devem ser feitas”, reforça Fabiana.
As obras realizadas no Jardim Lapena a partir dessa estratégia – como as de caminhabilidade – funcionaram como ponto de partida para a sistematização da abordagem do advocacy colaborativo. “O advocacy colaborativo consiste em construir em conjunto com técnicos da Prefeitura. Isso compreende também construir em conjunto a partir do território, pois todas as obras realizadas vieram do Plano de Bairro”, explica Fabiana Tock.
Controlar desvios em vez de apagar o trabalho
Outra dimensão da atividade Implementação de políticas públicas em periferias: desatando os nós abordou o controle na gestão pública. Consequentemente, passou também sobre como a preocupação em evitar problemas e improbidade em âmbito administrativo pode resultar na paralisia na atuação do poder público. Esse é, inclusive, o ponto central da pesquisa O Fenômeno do Apagão das Canetas.
Pedro Marin, coordenador do Programa Planejamento e Orçamento Público da Fundação, demonstrou, por meio dessa pesquisa, motivos pelos quais havia demora em entregas de obras públicas nas periferias.
Apesar de falar-se muito na gestão pública, poucas pesquisas nessa área ou na ciência política tentaram ouvir gestores para falar sobre o impacto do controle no dia a dia. Desse modo, um fator preponderante nesse sentido compreendeu a dimensão do controle sobre o trabalho de profissionais em gestão pública no cotidiano. Idem sobre como esse fator pode, dependendo de como for aplicado, representar entraves nesse cenário.
A baixa compreensão sobre particularidades na gestão pública é, então, um fator preponderante nesse contexto. “Os órgãos de controle não entendem, em geral, a complexidade e os dilemas que gestoras e gestores enfrentam na administração pública no dia a dia. Quem está no órgão de controle não passou pela vivência de implementar, por exemplo, uma obra de drenagem ou de habitação em um território periférico. Mas é lá colocado para controlar”, completa.
Texto e foto: Amauri Eugênio Jr.