Por Amauri Eugênio Jr. / Fotos: Alberto Rocha
Projetos com grande potencial de transformação social. Debates para encontrar maneiras de promover impactos em diversos segmentos sociais. Atores de áreas variadas reunidos para trocar experiências e encontrar consensos em favor da redução da desigualdade social. Eventos diversos realizados durante sete dias nos quais assuntos complexos foram retratados por especialistas em inovação social e que contaram com alto engajamento do público.
Realizada no Centro Cultural São Paulo entre 10 e 17 de setembro, a 1ª Mostra Gife de Inovação Social teve como objetivo principal destacar como são múltiplas as contribuições geradas ou impulsionadas por iniciativas filantrópicas e pelo investimento social privado. A Fundação Tide Setubal esteve presente no evento no “Encontro de Fazedores: Equidade e Diversidade”, do qual foi uma das organizadoras, e que teve participação de Wagner Silva (Guiné), coordenador de mobilização social e redes da fundação; e na conversa de inovação, da qual participaram Maria Alice Setubal, presidente dos conselhos da Fundação Tide Setubal e do Gife, e Alexandre Youssef, secretário municipal de Cultura de São Paulo.
O evento, do qual participaram mais de 300 iniciativas distribuídas em cantos diversos do país, contou com debates e demais atividades nos quais foram reunidos e mostrados aprendizados, experiências e práticas de fomento a soluções inovadoras para problemas coletivos. Vale dizer que os projetos retratados têm dinâmicas e estilos diversificados, passando por iniciativas educacionais, voltadas à equidade de gênero, racial e diversidade, socioambientais, envolvidas com a área cultural, empreendedorismo, entre outros diversos segmentos.
Em artigo sobre a mostra, publicado no jornal Folha de S.Paulo, Maria Alice Setubal destacou que outro objetivo da 1ª Mostra Gife de Inovação Social era mais mostrar também “como diversidade, liberdade e pluralidade são fundamentais para inovação e construção públicas, em lugar de obstáculo para elas, como querem fazer crer com frequência o discurso oficial e a atitude dominante entre nós hoje.”
Ainda, em entrevista que foi ao ar no Jornal Nacional, da Rede Globo, José Marcelo Zacchi, secretário-geral do Gife, destacou que foco da mostra era desenvolver respostas novas para problemas que fazem parte do cotidiano brasileiro. “A gente acha que é fundamental revalorizar e lembrar da contribuição do papel do cada um para a gente ter soluções completas mais do que conflitos e acirramentos na sociedade.”
Entender o passado para mudar o futuro
“É necessário ter conhecimento histórico para entender que o país não pode ser meritocrático. E isso é com pesquisa mesmo, ao trazer pessoas para entender a história do país.” Foi deste modo Adriana Barbosa, idealizadora da Feira Preta e CEO do PretaHub, descreveu como é possível falar sobre empreendedorismo sem recorrer a clichês que são impraticáveis para empreendedores de territórios periféricos, em virtude da desigualdade socioeconômica que é consequência da construção histórica do Brasil. Ela conversou com a reportagem da Fundação Tide Setubal após a sua palestra, feita no dia 11, na qual falou sobre empreendedorismo, desigualdade social e a importância de financiadores apoiarem pessoas com esse perfil.
Barbosa julga também que reconhecer a existência de processo sistêmico de exclusão afetam de modo enfático pessoas negras e periféricas para reconhecer o potencial de empreendedores de tais grupos. “Se eu olho para o sistema de exclusão e vejo que lá há negros e periféricos, e eles têm por potência empreender, é necessário investir nisso. Sinto falta de organizações olharem para o que já está acontecendo e o que é potência.”
Ainda de acordo com necessidade de mudança do modo como empreendedores negros e periféricos são vistos, Adriana Barbosa considera que a 1ª Mostra Gife de Inovação Social coloca atores diversos para pensar em soluções conjuntas, assim como dar visibilidade à importância de olhar – e investir – em negócios de impacto. “A gente precisa cada vez mais se encontrar e refletir aonde a gente está caminhando. Uma mostra [como esta] possibilita isso, pois traz pessoas que conseguem enxergar diversas realidades, voltar, pensar e ter senso crítico para fazer de outra forma.”
Foto: Alberto Rocha
Impacto tecnológico
Dizer que vivemos em um contexto social no qual o uso de recursos tecnológicos é cada vez maior e irreversível chega a ser senso comum. Independentemente da área de atuação e da dinâmica usada por uma iniciativa de impacto social ou uma organização da sociedade civil (OSC), a tecnologia estará presente até mesmo no modo como os envolvidos se comunicam.
Ainda assim, é necessário levar em consideração que o acesso a recursos desse tipo é desigual, logo, disparidades desse tipo precisam ser contornadas. “O acesso à internet, a alfabetização para as mídias e hardwares são menos presentes em regiões periféricas. Dito isso, a forma de contornar – ou ao menos remediar isso – é considerar isso como parte do desafio e da teoria da mudança. Ignorar o problema é exitar de desenhar soluções que sejam inclusivas, considerar o problema como um limitar impede a inovação”, explica Fabro Steibel, diretor-executivo do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS Rio).
Steibel considera que um dos efeitos mais significativos do investimento social privado em relação a empreendedores de territórios periféricos é permiti-los a arriscarem-se mais, pois medidas inovadoras têm maiores taxas de erro e são menos previsíveis do que fórmulas consolidadas: “o impacto virá, mas tem um custo de tentativa e erro. Portanto, inovações tecnológicas devem ser pensadas como investimentos de risco.”
Educação não é gasto: é investimento
Parece óbvio dizer que educação consiste em investimento e, como consequência, não deve ser vista como gasto; todavia, os últimos tempos passam a impressão de esse ser o caso. E, mesmo que soluções educacionais possam ser fomentadas pelo investimento social privado, o desafio para desenvolvê-las e implementá-las depende também de outros atores, em especial do poder público – ou seja, trata-se de uma missão de todos.
“O papel dos institutos e fundações, assim como do investimento social privado dentro dessa busca, diz respeito à pluralidade necessária para encarar os desafios da educação pública no país, que são muitos”, pondera Alan Correia, coordenador de Comunicação do Itaú Social. Logo, é necessário dizer que o fomento à educação deve contemplar a pluralidade de dinâmicas sociais e de contextos complexos: “o olhar para a educação precisa ser mais ampliado. Estamos falando de um desafio plural, que passa por olhar para contextos de forma [que contemple] a pluralidade e olhares plurais por si sós, que passem por diversas frentes e vindos de diversas organizações.”
Alan Correia considera que, dentro deste cenário, a Mostra Gife teve como diferencial reunir atores de diversas origens no mesmo espaço, o que foi uma força motriz para a discussão no mesmo espaço sobre aspectos tão plurais e diferentes entre si. “O potencial da mostra para suscitar debate amplo sobre investimento social, desenvolvimento social e desenvolvimento educacional passa pela materialidade existente e pela reunião de informações diversas. Há diversos dados disponíveis para pessoas terem olhar ampliado sobre os temas propostos”, finaliza.