Fundação Tide Setubal
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No Festival, autores revelam inspirações e detalhes de seu processo criativo

@Comunicacao

31 de outubro de 2011
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A sexta edição do Festival do Livro e da Literatura de São Miguel, realizada pela Fundação Tide Setubal, de 25 a 27 de outubro, levou um time de primeira linha de escritores para conversar com o público. Entre outros convidados, passaram por lá: Ferreira Gullar, Eucanaã Ferraz e Luiz Ruffato. O clima era de descontração, permitindo que abordassem detalhes sobre suas trajetórias, produção dos livros e importância da leitura e da literatura para a formação do indivíduo.

 

Boa parte da plateia desses encontros era composta por estudantes de escolas públicas da região leste e da Universidade Cruzeiro do Sul. De acordo Tião Soares, idealizador do Festival e coordenador de Cultura da Fundação, foi feita uma mescla de autores reconhecidos nacionalmente com os destaques da literatura periférica, como Ferréz e Sacolinha. “Nossa intenção era despertar no público o interesse pela leitura, pelo conhecimento e pela troca de saberes”, conta.

 

 

Poesia como vocação

 

Ferreira Gullar, homenageado pelo Festival, encerrou a programação com uma palestra na noite de quinta-feira (27/10), na tenda da Praça Fortunato da Silveira (Morumbizinho). Instigado pelo jornalista Claudiney Ferreira, o poeta começou relatando sua militância em movimentos contra a ditadura militar, na década de 1960. “A grande lição daquela época foi que a arte, antes de ser política, deve ser arte. O conteúdo de um poema pode ou não ser político, mas necessita ter qualidade artística”, refletiu Gullar.

 

Ele contou sobre sua juventude no Maranhão, destacando o encontro com a poesia modernista brasileira. “Antes, escrevia como os parnasianos. A partir da leitura de Drummond, descobri que o poema pode nascer do cotidiano, da banalidade da vida”. Ao ser indagado se se considerava jornalista, poeta ou dramaturgo, respondeu: “Nunca planejei ser poeta. A poesia é uma vocação. Sou poeta. Mas o poema nasce do espanto, não há como programar. É diferente de quando se escreve um artigo para o jornal”.

 

Sobre a inspiração, contou que “Jasmim”, por exemplo, surgiu do cheiro selvagem que a flor exala. Ao fim da conversa, declamou esse poema e autografou livros para o público. Pairou no ar uma sensação de encantamento: muitos saíram dali com o desejo de conhecer mais. “Fiquei curiosa para devorar a obra dele”, disse Leida de Pina, aluna do EJA (Educação de Jovens e Adultos), da escola pública Astrogildo Arruda.

 

 

Construção interior

 

Na terça (25/10), o primeiro dia do Festival, a tenda da Morumbizinho recebeu Daniel Reis, César Magalhães Borges, Ferréz e Valmir Souza. Daniel falou sobre a obra Anchietinha: “O formato em quadrinhos foi uma decisão para atrair o público infanto-juvenil a conhecer a história do bairro de São Miguel Paulista”. César, poeta de Guarulhos, mostrou seu quinto livro O ciclo da lua e afirmou: “Acredito que a literatura ajuda a trabalhar nossa construção interior”.

 

Férrez concordou e acrescentou o caráter de resistência. “Hoje, corremos contra o tempo. Nunca há tempo para desfrutar, para refletir. A literatura faz pensar, faz sermos diferentes”. Valmir, autor de Cultura e literatura: diálogos, contemporizou: “Escrever é um ato de conspirar, uma vez que o escritor pode dar visibilidade para questões pouco ou mal exploradas pela sociedade”.

 

 

Crítica social e cidadania

 

Na quarta-feira (26/10), o palco do encontro com autores foi o CDC Tide Setubal. Lá Marcelino Freire e Sacolinha também focaram no potencial da literatura para alargar a visão de mundo. Marcelino, pernambucano, filho de mãe semi-analfabeta, redigia na infância cartas para os familiares. O poema “O Bicho”, de Manoel Bandeira, marcou sua vida e despertou-lhe a vontade de escrever por profissão. “Não me saía da cabeça como um homem poderia ser menor que um rato! Grandes artistas provocavam o questionamento e nos acordam. O Bicho despertou em mim a solidariedade e a cidadania”, relatou.

 

Sacolinha destacou o quanto a leitura do livro Quarto de despejo: diário de uma favelada foi determinante para sua carreira literária. “Percebi que queria um espaço para falar da minha comunidade com o olhar de quem vive na periferia. A literatura é uma forma de expressar indignação. Uso a caneta para não colocar o dedo na cara das pessoas”, disse o jovem, de 28 anos, que foi cobrador de lotação em Itaquera e não gostava de ler até seus 18 anos.

 

 

Arma louca

 

Livros marcantes também renderam muita conversa na mesa de quinta-feira à tarde, na Morumbizinho. Luiz Ruffato e Eucanaã Ferraz contaram com mediação da jornalista da Folha de S.Paulo Raquel Cozer. Rufatto contou que, com Rogério Pereira — do jornal literário Rascunho —, ele criou a Igreja do Livro Transformador. Juntos, eles procuram “novos fiéis”, dispostos a postar vídeos no Youtube com depoimentos sobre obras decisivas em suas vidas. No caso do próprio Rufatto, trata-se de Babi Yar, de Anatoly Kuznetsov, que gira em torno de um massacre judeu em Kiev. “Com ele, viajei pela gélida Ucrânia, descobri outras línguas, outros povos e um mundo mais amplo, quando ainda estava no colégio.”

 

Eucanaã ressaltou o poder revolucionário da literatura: “Os livros mudaram a história do homem. Pensem no papel da bíblia. O livro é uma arma louca”. Depois dos depoimentos, a mediadora questionou a plateia sobre quem dali desejava seguir carreira na literatura. Três jovens se manifestaram. Uma delas, Viviane Ferreira de Souza, 25 anos, moradora de Itaquera, relatou que soube do Festival do Livro pelo jornal. “Gostei bastante. Só conhecia o Ruffato pela televisão. Saio daqui com um ótimo convite para ler as obras desses dois autores.”


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