Ponto de Leitura no Jardim Lapena, 15 anos: mostrando caminhos para a população abrir portas e escrever a própria história
Os 15 anos do Ponto de Leitura no Jardim Lapena contaram com evento que destacou a importância do espaço para a comunidade. Saiba como foi.
A celebração dos 15 anos do Ponto de Leitura no Jardim Lapena, localizado na zona leste de São Paulo, foi marcada por um evento que destacou a importância desse espaço para a comunidade. A iniciativa, que nasceu da parceria entre Fundação Tide Setubal, Secretaria Municipal de Cultura e Sistema Municipal de Bibliotecas de São Paulo, tem desempenhado papel crucial na promoção da leitura e no desenvolvimento cultural da região.
Ao contrariar a ideia de que a leitura perdeu seu apelo, o Ponto de Leitura no Jardim Lapena tornou-se um símbolo de resistência cultural e um espaço de encontro e acolhimento para os moradores. Idem o símbolo material de que é possível construir novos mundos e traçar novos horizontes para as trajetórias de todas e todos nós.
A história dos Pontos de Leitura no Brasil
Os Pontos de Leitura consistem em iniciativa que visa democratizar o acesso aos livros e à cultura, especialmente em áreas de vulnerabilidade social. No Brasil, esses espaços surgiram como parte de uma política pública de incentivo à leitura e à formação de pessoas leitoras críticas. Iniciativas como o Programa Nacional de Incentivo à Leitura (Proler) e o Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas (SNBP) foram fundamentais para a criação e manutenção desses pontos.
Espaços como o Ponto de Leitura do Jardim Lapena não apenas fornecem acesso aos livros, mas também promovem atividades culturais e educativas que visam integrar a comunidade e fomentar o desenvolvimento social.
Impacto e Relevância do Ponto de Leitura no Jardim Lapena
Desde a sua inauguração, o Ponto de Leitura do Jardim Lapena tornou-se um local de referência na região. Segundo Malu Gomes, responsável pelo espaço desde o início, em 2009, o Ponto de Leitura é, hoje, referência na região. “Já faz tempo que temos boa procura pelos livros com pessoas de diversas idades”.
Malu destaca que, inicialmente, houve alguma resistência, pois as periferias, como o Jardim Lapena, não estavam habituadas a ter uma biblioteca pública. No entanto, com o tempo, o espaço se consolidou como um local de integração e acolhimento da comunidade.
O Ponto de Leitura do Jardim Lapena desempenha papel político significativo, funcionando como um espaço onde moradoras e moradores podem se encontrar, conversar e desenvolver consciência crítica da realidade. “O Ponto de Leitura tem poder político muito forte. Ao se tornar um ponto de encontro, as pessoas começam a conversar e a se tornar mais críticas da realidade”, afirma Malu. Esse ambiente de escuta e diálogo fortalece o vínculo de confiança entre a população e contribui para a construção de uma comunidade mais unida e consciente.
Depoimentos e transformações
Os depoimentos de pessoas frequentadoras e colaboradoras do Ponto de Leitura do Jardim Lapena evidenciam o impacto positivo que esse espaço tem na vida das pessoas.
Luck Vas, cantor e compositor, ressalta que “o Ponto de Leitura é um lugar de encontro e muito acolhedor. As pessoas se sentem em casa e, quando buscam um livro, buscam essa sensação”.
Para Matheus Carvalho (DK), agente cultural e fundador do projeto Casa das Quebradas, o Ponto de Leitura foi um local de inspiração e formação. “Conheci, no Ponto de Leitura, o Plano de Bairro. Criamos aqui, inclusive, o Casa das Quebradas. O Ponto de Leitura é uma rede e espaço confortável onde você chega e se sente bem”.
Bruna Caroline, artista do território, relembra sua trajetória. “O Ponto de Leitura me acolheu desde pequena, quando o frequentava para estudar. Hoje faço poesia e sou artista, porque o Ponto de Leitura fez isso por mim”. Já a assistente social Tayane Freitas destaca, então, a importância do espaço em sua vida pessoal e profissional: “No território não havia nenhum lugar para eu ter contato com livros. O Ponto de Leitura foi o meu primeiro espaço e faz parte da minha história pessoal e profissional. É um espaço onde é possível sonhar”.
Suely Aparecida, também frequentadora do Ponto de Leitura, participa das Tardes de Fuxico, que são encontros para pessoas com mais de 60 anos que promovem socialização comunitária por meio de tricô e costura. Suely valoriza esses momentos de distração e reconhecimento. “Faz três meses que faço oficina de fuxico no Ponto e gosto muito. É um momento de distração e de reconhecimento com os meus artesanatos.”
Atividades de comemoração
As celebrações dos 15 anos de funcionamento do Ponto de Leitura do Jardim Lapena contaram, em 18 de junho, com programação especial de eventos organizados com e para a comunidade.
A dupla Tuingo e Bastião abriu a festa com o espetáculo que teve o baião como ritmo central. Houve, na sequência, um bate-papo com a escritora e fundadora do Piraporiando, Janine Rodrigues, e um encontro com o autor, poeta e escritor Andrio Candido e a escritora, educadora e gestora cultura Neide Almeida. Assim sendo, o mote do diálogo entre a dupla foi sobre Vivências literárias e um olhar para as questões raciais.
“Participar dessa festa foi um presente também pra mim”, diz Neide Almeida. “O Ponto de Leitura é um espaço de encontro que tem como ponto de partida a leitura mas que vira um espaço de acolhimento e de transformação. Ele precisa ser cada vez mais conhecido e reconhecido.”
As comemorações sobre os 15 anos do Ponto de Leitura do Jardim Lapena contaram, por fim, com sessão de autógrafos para marcar o lançamento da autobiografia Minha escolha pela Ação Social, da presidente da Fundação Tide Setubal, Neca Setubal.
O evento finalizou com pocket show protagonizado pelo cantor Luck Vas.
Dados de acesso e atividades realizadas
Em 2023, o Ponto de Leitura do Jardim Lapena recebeu 6.390 visitas, com pessoas de diferentes faixas etárias participando das atividades promovidas no local. As iniciativas incluem mediações de leitura e atividades como:
- Quartas Gamers, que contam com jogos lúdicos, inclusive com temas literários;
- Quintas de Sarau Cinema, com integração entre cinema e literatura;
- Sexta Fazendo Arte, que são atividades com desenho livre para crianças.
Essas atividades fomentam também a criatividade e a imaginação dos participantes, proporcionando um processo de autodescoberta e desenvolvimento artístico.
Além das atividades regulares, o Ponto de Leitura do Jardim Lapena também promove encontros e intercâmbios culturais. Alguns deles são como o realizado com 30 crianças e adolescentes do bairro e jovens da Comunidade Boa Vista (PA). A iniciativa ocorre, então, por meio da Rede Vaga-Lume, organização parceira de longa data do espaço.
“Essa ponte de 11 anos entre o Lapena e as comunidades ribeirinhas do Amazonas reforça o fortalecimento de vínculos entre adolescentes com realidades tão distintas mas que se aproximam pela escrita e pela leitura”, ressalta Priscila Fonseca, coordenadora do Programa Rede, na Vagalume.
Além disso, foram distribuídos 450 marcadores de páginas com desenhos de três artistas da região, fortalecendo o vínculo entre a comunidade e o espaço cultural.
O papel transformador das bibliotecas
O exemplo do Ponto de Leitura do Jardim Lapena reflete, então, uma tendência global de utilizar bibliotecas como instrumentos de transformação social. Nesse sentido, um caso emblemático é o dos Parques Biblioteca de Medellín, na Colômbia. A construção de tais equipamentos nas periferias da cidade ajudou a reduzir os índices de violência urbana e promover o desenvolvimento comunitário. Logo, esses espaços servem como locais de mudança e desenvolvimento, oferecendo acesso à cultura, educação e oportunidades de integração social.
A comemoração dos 15 anos do Ponto de Leitura do Jardim Lapena destaca a importância desse espaço para a comunidade e para o desenvolvimento cultural da região. Por meio de iniciativas como essa, é possível combater as desigualdades socioespaciais, promover a justiça social e transformar a realidade das periferias urbanas.
Finalmente, o Ponto de Leitura do Jardim Lapena é um exemplo vivo de como a leitura e a cultura podem servir como ferramentas poderosas de mudança e empoderamento comunitário, criando um futuro mais justo e inclusivo para todas as pessoas.
Por Daniel Cerqueira, com colaboração de Carolina Nascimento