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“Novas configurações das cidades ameaçam a apropriação do espaço público e o pertencimento dos cidadãos”, acredita Saskia Sassen

Programas de influência

21 de junho de 2016
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As grandes cidades têm adquirido, cada vez mais, novas configurações, colocando em risco a convivência e apropriação do espaço público e acirrando desigualdades e polarizações, com distânciamentos cada vez maiores entre centro-periferias. Essa tendência têm sido observada pela socióloga holandesa Saskia Sassen, referência mundial na área da sociologia urbana, que compartilhou sua visão sobre o tema na conferência de abertura do Seminário Internacional Cidades e Territórios: encontros e fronteiras na busca da equidade.

 

A professora da Universidade de Columbia (EUA) iniciou a sua fala destacando que, antes de mais nada, é preciso redescobrir o que são de fato as cidades e a necessidade de se proteger esse conceito, pois a cidade transforma a todos em sujeitos urbanos. “Uma imagem que representa isso é a hora do rush, em que os cidadãos tentam pegar um trem. Há uma mistura e aproximação de classe, gênero, raça etc. Nesse momento somos todos sujeitos urbanos. Portanto, iguais”, ressaltou, enfatizando que é preciso ouvir a cidade, pois ela tem voz.

 

“Mas nós perdemos a capacidade de entender como a cidade, com a complexidade do espaço, pode falar conosco e transformar as coisas. Um exemplo é o carro super potente que, quando chega ao Centro da cidade, deixa todos os seus potenciais e anda como uma bicicleta. Aí a cidade falou”.

 

Analisando os movimentos que dispontaram as novas configurações metropolitanas, a socióloga chamou atenção ao fato de que está ocorrendo uma desurbanização das grandes cidades, com a chegada de megaempreendimentos multinacionais que ocupam boa parte de um território, eliminando suas ruas, vielas, praças etc.

 

“Há, portanto, um impacto direto na vida dos cidadãos, pois a cidade é um local onde as pessoas sem poder aquisitivo também podem ter história, cultura e gerar economia, mesmo que seja numa comunidade específica. E isso não é possível de se fazer dentro de um empreendimento. Assim, quanto mais projetos de grande porte, mais essa possibilidade é tirada das nossas mãos”, enfatizou.

 

A construção desse cenário vem sendo motivado, nos últimos anos, pela ampliação de compra de propriedades urbanas. Só em 2015, mais de R$1 trilhão de dólares em todo o mundo foram usados para compra de propriedades nas 100 principais cidades do mundo, incluindo São Paulo. Com isso, os imóveis têm adquirido grandes valores, gerando uma crise imobiliária de casas mais modestas e fazendo com que a população tenha que se deslocar para regiões cada vez mais periféricas para conseguir comprar ou alugar um imóvel.

 

“Se um professor, um enfermeiro ou um bombeiro precisa se deslocar mais de duas horas para ir de casa ao trabalho por conta disso, então temos um problema. Em Nova Iorque, por exemplo, o governo está pagando um valor a mais a estes profissionais para que possam morar um pouco mais perto do Centro da cidade e não gastem tanto tempo em deslocamento. Enquanto isso, os empreendimentos de luxo estão com as luzes apagadas. Isso é uma grande distorção do que a cidade deve ser”, comentou, explicando que isso ocorre porque atualmente a melhor forma de fazer investimento é comprar propriedades em grandes cidades.

 

Outro ponto fundamental a ser discutido, na opinião da socióloga, deve ser o aspecto imaterial destas propriedades, ou seja, o que está invisível e que merece atenção. Isso porque muitas terras nas quais construções históricas estão instaladas e que são patrimônios nacionais estão passando para mãos de empresas estrangeiras.

 

Saskia destacou ainda que, apesar do espaço urbano estar sob ameaça, com centenas de estradas construídas, aquisição de imóveis, dificuldades habitacionais etc, há um movimento surgindo nas localidades a fim de favorecer as economias locais, como comércios, cooperativas, microempreendimentos, microcrédito etc, e que é preciso fortalecê-los.

 

Um caminho para tal é incentivar o desenvolvimento de iniciativas – envolvendo universidades, organizações sociais, órgãos públicos etc – que, a partir da identificação das necessidades locais, preparem os cidadãos para atuarem nestes campos.

 

E perguntou ao público: “Será que precisamos de fato de uma multinacional para tomar um cafezinho, quando temos pequenos cafés nas cidades que estão lá há gerações? Todas as franquias ao invés de ajudar a circular o recurso no território, leva-o para a sua sede”.

 

Ao final, a socióloga retornou à sua fala inicial sobre o fato da cidade nos tornar sujeitos urbanos e questionou: “E por quê isso tudo importa? É porque a cidade é um dos poucos espaços em que as pessoas podem ser atores e realizadores. A cidade tem a capacidade de permitir que as pessoas que estão mais ou menos alienadas comecem a sentir que também fazem parte disso. É preciso que esse sentimento de pertencimento apareça”, disse Saskia.


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