Analista de comunicação e produtor de conteúdo do site da Fundação Tide Setubal
Secretário Executivo do Ministério da Cultura debate propostas com a comunidade
Lançamento da Revista Cultura: Diálogos para o Desenvolvimento Humano também marcou o evento
Maria Alice Setubal, Tião Soares (centro) e Alfredo Manevy. (Fotos: Verônica Manevy) |
A população de São Miguel Paulista participou no sábado, 16 de maio, no CDC Tide Setubal, do II Encontro Cultura e Sustentabilidade: Diálogos para Construção de um Projeto de Desenvolvimento Cultural. Alinhado ao foco da Fundação Tide Setubal sobre a centralidade da cultura para o desenvolvimento social e humano e a necessidade de seu entendimento como política por parte do poder público, o evento proporcionou um amplo debate com questões como a lógica do repasse de recursos, a necessidade de equipamentos culturais na Zona Leste a importância da capacitação de agentes.
Integrantes do Movimento Popular de Arte iniciaram a atividade com uma intervenção artística. Em seguida, sob a mediação de Maria Alice Setubal, socióloga e diretora-presidente da Fundação, e com a participação de Tião Soares, coordenador de projetos, o secretário executivo do Ministério da Cultura, Alfredo Manevy, focou sua exposição na importância de tratar a pasta da Cultura com estratégias de política pública. “A grande novidade desses últimos anos tem sido a presença da cultura na agenda política do país”, afirmou.
Alfredo Manevy, secretário executivo do Ministério da Cultura, durante o II Encontro Cultura e Sustentabilidade. |
Para exemplificar essa mudança de atitude no governo Lula, Manevy citou uma pesquisa encomendada ao IBGE e ao Ipea, com o objetivo de mapear a área de atuação do Ministério. Os dados levantados impressionam pela escassez: em média, apenas 10% dos brasileiros freqüentam cinemas, 8% vão ao teatro e 6% visitam museus e exposições de arte. “Essa exclusão de grande parte da população dos equipamentos culturais não significa que não tenhamos cultura”, explicou o secretário. “Na verdade, há um apartheid no acesso a bens e a serviços culturais. E garantir tanto o acesso como a produção cultural são missões complementares do Ministério.”
Ao longo de sua exposição, o secretário destacou, ainda, o entendimento da cultura em três dimensões. A primeira seria a simbólica, da sociedade, pela qual se reconhecem os patrimônios materiais e imateriais, todas as manifestações e o repertório cultural brasileiro. A cultura como direito e parte da cidadania resumiria a segunda dimensão: “a cultura não é um adereço, é um direito social universal”, explicou. Para completar, deve-se acrescentar a economia da cultura, ou seja, a área como negócio gerador de renda e que movimenta montantes consideráveis de recursos.
Mudanças à vista
Foi considerando essa concepção abrangente, que o Ministério da Cultura desenhou o Plano Nacional de Cultura (PNC) e o Sistema Nacional de Cultura (SNC), propostas do governo federal que incluem importantes mudanças no âmbito da criação e da administração de equipamentos culturais e na destinação de verbas para a produção cultural. “Com essas idéias, procuramos sistematizar o relacionamento e o repasse de recursos entre governos federal, estaduais e municipais de maneira lógica”, defendeu o Manevy. Ele garantiu que o objetivo principal do PNC é a legitimação e concretização de uma política pública, que transcenda governos e ministros, garantindo planejamentos de longo prazo.
Para o artista Sacha Arcanjo, que estava na platéia do evento, trata-se de uma mudança positiva. “O Plano está melhorando a situação; parece que veio para ficar, e assim as coisas andarão”, afirmou.
Na esteira do Plano, está uma proposta de alterações na Lei Rouanet, mecanismo de financiamento cultural que, nos últimos oito anos, permitiu injetar R$ 9 bilhões em projetos por renúncia fiscal de empresas. Enviada a consulta pública, a proposta recebeu mais de duas mil sugestões, que serão sistematizadas e incorporadas ao projeto final. De acordo com o secretário, é importante manter a renúncia fiscal, mas criando, paralelamente, outros mecanismos de incentivo, como o financiamento direto a pessoas físicas, além do que ele chamou de “mecenato privado” – por essa idéia, os recursos públicos da renúncia fiscal devem ser complementados por investimento privado.
Porém, para levar a cabo as mudanças no financiamento, o secretário reconheceu a necessidade de capacitar agentes culturais, problema levantado por Warny Santana, da subprefeitura de São Miguel, durante o debate que sucedeu a fala do secretário. Com Warny concordou Maria Alice Nassif, gerente adjunta de programas socioeducativos do Sesc-SP e uma das debatedoras do I Encontro Cultura e Sustentabilidade. “A formação de pessoas e a colocação delas para tocar programas é nossa maior dificuldade”, disse. “Temos de ter gente capacitada, envolvida, gente absolutamente seduzida pela causa da cultura.”
Warny Santana (esquerda)e Maria Alice Nassif durante o encontro. |
No que se refere ao orçamento público, o secretário lembrou que está em trâmite uma Proposta de Emenda Constitucional, a PEC 150, que visa garantir um piso orçamentário vinculado para a cultura, de 2% do orçamento total do governo. “Não há política pública sem seu principal instrumento, que é o orçamento”, afirmou Manevy. “Temos uma possibilidade real de chegar a 2%, que seria um patamar de dignidade para pensarmos em políticas públicas.”
Memorial da Zona Leste
Durante a sessão de debates, e em conversas individuais com o secretário, antes e depois do evento, a comunidade cobrou a construção de equipamentos culturais para a região, como o Memorial de Cultura da Zona Leste. “Estamos há 30 anos na luta por um espaço que conte a história dos povos daqui”, reivindicou Luís França, integrante do movimento Nossa Zona Leste. O secretário disse estar à disposição para essa discussão e mencionou a possibilidade o projeto ser posto em prática por meio do programa Mais Cultura, do governo federal.
Uma apresentação da Folia de Reis de São Miguel encerrou o encontro. Antes, porém, houve o lançamento oficial da revista Cultura e Sustentabilidade. A publicação da Fundação Tide Setubal traz as exposições de Danilo Santos de Miranda, diretor regional do Sesc; Altair Moreira, assessor técnico-cultural do programa Fábricas de Cultura; e Maria Lucia Montes, professora de antropologia, participantes da primeira edição do Encontro, realizado em setembro de 2008, além do resumo do debate com a comunidade e uma lista de propostas concretas, surgidas nos grupos de discussão, para aprimorar as políticas públicas para a cultura. Com tiragem inicial de 1.000 exemplares, a revista será distribuída gratuitamente.
Resultado do primeiro encontro, a revista Cultura: Diálogos para o Desenvolvimento Humano foi distribuida aos participantes do evento. |
A opinião de quem participou
Mais de 120 pessoas prestigiaram o II Encontro Cultura e Sustentabilidade, realizado no CDC Tide Setubal. Eram artistas, lideranças da área de cultura, educadores, estudantes, curiosos. Eles mostraram na prática do diálogo a importância da participação da comunidade em discussões que fazem história. A seguir, a observação de alguns dos presentes:
“Fico muito animada em ver o entusiasmo das pessoas. Mas temos de parar de falar no futuro. Nós queremos ações concretas.” Beatriz Segall, atriz, participa do GT de Cultura do Movimento Nossa São Paulo. |
“Nesse encontro com um secretário de Brasília aqui, sentimos a importância de morarmos em um lugar no qual não estamos isolados do país – temos felizmente um espaço aberto para discutir grandes questões da cultura. As informações foram úteis, ainda mais tendo em vista que dificilmente a imprensa detalha o assunto.” |
“Esse tipo de encontro é importante, pois os moradores do bairro que lidam com cultura podem ser os multiplicadores dessas informações para a comunidade local. Além disso, a presença de uma autoridade vem reforçar a vocação histórica de São Miguel Paulista de ser um pólo irradiador na promoção do desenvolvimento.” Sueli Kimura, educadora e presidente do Instituto de Pesquisa em Desenvolvimento Social e Humano (IPEDESH). |
“Para as coisas acontecerem, é preciso que haja uma luta, um movimento reivindicando espaços culturais, parques e outras necessidades. Esses acontecimentos fazem com que as idéias tomem corpo.” Sacha Arcanjo, artista, membro do Movimento Popular de Arte. |