‘Tecendo Histórias e Memórias’: livro apresenta narrativas de mulheres do Jardim Lapena

Lançado no final de 2024, o livro Tecendo Histórias e Memórias: Uma rede de narrativas construída com fios da escrita coletiva de mulheres é um marco na construção de memórias e no fortalecimento do protagonismo feminino no Jardim Lapena, território periférico da zona leste de São Paulo. A obra, resultado de uma oficina de escrita promovida pelo Galpão ZL, equipamento cogerido pela Fundação Tide Setubal, reúne textos de nove mulheres moradoras do bairro, que tecem, por meio de suas histórias, painel rico e sensível sobre suas vivências, desafios e sonhos.

Idealizada por Carolina Nascimento, mestranda em Comunicação pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) e ativista social, a iniciativa nasceu de um desejo de criar um espaço de acolhimento e troca entre mulheres. “O projeto surgiu de uma inquietude compartilhada com Malu [Gomes], coordenadora do Ponto de Leitura do Jardim Lapena. Queríamos um lugar onde as mulheres pudessem se reconhecer como autoras de suas próprias histórias”, explica Carolina. A oficina, realizada entre julho e novembro de 2024, promoveu encontros mensais que misturavam leitura, escrita e reflexões sobre temas como identidade, território e educação.

Protagonismo feminino e escrita como ferramenta de transformação

O livro Tecendo Histórias e Memórias: Uma rede de narrativas construída com fios da escrita coletiva de mulheres é uma celebração do protagonismo das mulheres do Jardim Lapena. Elas constroem,, por meio da escrita, memórias pessoais e coletivas, refletindo sobre suas trajetórias e o papel que ocupam no território. “Essas mulheres são agentes de suas próprias histórias. Elas mostram que a escrita não é apenas um ato individual, mas uma ferramenta poderosa para transformar realidades”, destaca Carolina.

Entre as autoras está Tatiane Lourenço, pedagoga com atuação no bairro, que compartilha suas experiências como educadora e sua paixão pelo território. “O Jardim Lapena é um lugar de potência e esperança. Aqui aprendo todos os dias com as crianças e famílias que atendemos. Escrever sobre isso foi uma forma de reconhecer a importância desse lugar na minha vida”, afirma. Em seu texto, Tatiane reflete sobre a educação como um ato de amor e resistência, especialmente em um contexto marcado por desigualdades.

Já Jesuíta Araújo, pedagoga e contadora de histórias, traz em sua narrativa a riqueza das raízes indígenas de quem cresceu na região Norte do país. Os seus escritos trazem também a importância da oralidade em sua trajetória. “Participar deste projeto foi uma experiência transformadora. Pude reviver memórias da minha infância no Pará e refletir sobre como essas histórias me moldaram. A escrita me deu mais segurança para contar minhas próprias vivências e inspirar outras mulheres a fazerem o mesmo”, compartilha Jesuíta.

Processo coletivo e afetivo de produção

A produção do livro Tecendo Histórias e Memórias: Uma rede de narrativas construída com fios da escrita coletiva de mulheres foi um processo intenso e colaborativo, envolvendo não apenas as autoras, mas também outras mulheres que contribuíram com revisão, ilustração e design. Bruna Caroline, jovem artista do território, foi responsável pelas ilustrações, que retratam as autoras de forma sensível e representativa. Já Jéssica Figueiredo, designer e colaboradora do Galpão ZL, cuidou da capa e do layout, enquanto Maiara Evangelista realizou a revisão voluntária dos textos.

“O livro foi feito a muitas mãos. Cada detalhe carrega um pouco do afeto e da dedicação de todas as envolvidas”, ressalta Carolina. A obra também conta com prefácio e introdução de Francine Mendonça e Neide Almeida, duas convidadas que compartilharam suas experiências com as autoras durante os encontros. “Elas trouxeram um olhar inspirador sobre a importância de contar e preservar histórias, especialmente as de mulheres periféricas”, complementa.

Conexão com o Programa Prática de Desenvolvimento Local

O lançamento do Tecendo Histórias e Memórias: Uma rede de narrativas construída com fios da escrita coletiva de mulheres alinha-se aos objetivos da área de Prática de Desenvolvimento Local da Fundação Tide Setubal, que atua no Jardim Lapena há mais de dez anos por meio do Galpão ZL.

A equipe de Prática de Desenvolvimento Local busca, então, promover o desenvolvimento econômico, urbano e humano do território, fortalecendo a autonomia dos moradores e fomentando iniciativas que melhorem a qualidade de vida no bairro.

“O livro é um exemplo concreto de como o protagonismo local pode gerar transformações significativas. Ao compartilhar a voz dessas mulheres, fortalecemos não apenas suas identidades, mas também a comunidade como um todo”, afirma Carolina. A obra também reflete a premissa da Fundação Tide Setubal de trabalhar com a comunidade, valorizando o território como espaço de potência e inovação.

Impacto e legado

O lançamento do livro, que aconteceu em dezembro de 2024, reuniu cerca de 50 pessoas no Galpão ZL. O evento  foi marcado por emoção e celebração. “Foi um momento de reconhecimento e orgulho para todas nós. Ver as autoras autografando seus livros e recebendo o carinho do público foi incrível”, relata Carolina. A obra já está registrada na Biblioteca Nacional e deve ter distribuição para outras bibliotecas e instituições, ampliando seu alcance e impacto.

Para as autoras, o projeto foi uma oportunidade de crescimento pessoal e profissional. “Aprendi a valorizar minha história e a reconhecer o poder da escrita como ferramenta de transformação”, diz Jesuíta.

Por fim, Tatiane complementa. “Esse livro é um legado para o Jardim Lapena. Ele mostra que, mesmo em meio às dificuldades, somos capazes de criar algo belo e significativo.”

Com planos de expandir a iniciativa em 2025, Carolina Nascimento já trabalha na organização de novas oficinas e na busca de parcerias para viabilizar a impressão de mais exemplares. “Queremos que o livro Tecendo Histórias e Memórias inspire outras mulheres a contarem suas histórias e a se reconhecerem como agentes de mudança em seus territórios”, finaliza.

O livro é, portanto, mais do que uma coletânea de textos. É um testemunho da força e da criatividade das mulheres do Jardim Lapena, território que, apesar das adversidades, segue tecendo histórias de resistência, esperança e transformação.

Texto: Daniel Cerqueira