Congresso Gife mostra que raça e gênero devem estar no centro da promoção da equidade
Primeiro dia do 12° Congresso Gife conta com debate sobre como as OSCs e o ISP podem atuar de modo direto na defesa da democracia.
Raça e gênero precisam ocupar papel central no desenvolvimento de todo e qualquer projeto para ser efetivo no enfrentamento das desigualdades. Essa foi uma das principais conclusões do 12° Congresso Gife, que foi realizado de 12 a 14 de abril, no Auditório Simón Bolívar, do Memorial da América Latina.
A 12ª edição do evento realizado pelo Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife) teve o mote Desafiando as estruturas de desigualdades como fio condutor para o tom das plenárias para debates sobre temas diversos dentro dessa dinâmica – das quais raça e gênero tiveram papéis centrais.
Esse aspecto foi reforçado por Cássio França, secretário-geral do Gife, durante a solenidade de abertura do evento. “Este congresso foi feito para sairmos provocados daqui e nos questionarmos se estamos fazendo o suficiente para enfrentarmos as desigualdades. Precisamos de mudanças sistêmicas e a provocação para vocês, hoje, é que entremos no lugar de imaginar que estamos fazendo ou pouco ou que dá para fazer mais.”
Para além disso, outra dimensão no debate sobre o enfrentamento das desigualdades, que França apresentou na sua fala durante a abertura do 12° Congresso Gife, contemplou a defesa do tecido democrático, segundo a qual “não existe democracia forte sem sociedade civil forte”, e deu o tom da primeira plenária – Democracia em risco e o papel da Sociedade Civil.
Sobre estarmos atentas/os e fortes para defender a democracia
A primeira mesa de debate, Democracia em risco e o papel da Sociedade Civil, foi mediada por Atila Roque, diretor da Fundação Ford no Brasil, e contou com participações das seguintes lideranças:
- Conrado Hübner Mendes, professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e pesquisador do Centro de Análise da Liberdade e do Autoritarismo (Laut)
- Maria Alice Setubal, presidente do Conselho Curador da Fundação Tide Setubal
- Stephen Hawkins, diretor de pesquisa da organização More in Common
- Cida Bento, cofundadora do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (CEERT) e autora do livro O Pacto da Branquitude.
Em sua fala, Maria Alice Setubal, presidente do Conselho da Fundação Tide Setubal, apresentou diversas dimensões para o trabalho de organizações nas diversas dimensões para a defesa da democracia, ao contemplar dimensões como o fortalecimento de organizações e lideranças atuantes em territórios periféricos para que possam ocupar espaços políticos de poder e de decisão.
Outra dimensão do trabalho para fortalecer o tecido democrático contra perspectivas autocráticas contempla as estruturas das próprias organizações. “Precisamos olhar para dentro e ver como estamos para podermos olhar para fora, pois isso é muito importante”, destaca Maria Alice Setubal. “Estamos fazendo esforços para haver mais pessoas negras nas organizações, e abrir para as questões LGBTQIAP+ nas nossas instituições? Isso é fundamental.”
Desse modo, Maria Alice ressaltou também que o momento político extremo e inédito pelo qual o país passou – e ainda passa – requer postura firme e enfática, por parte do campo do investimento social privado, em defesa da democracia. “O ISP precisa ter posicionamento político não partidário em favor da democracia. Considero isso como fundamental: não podemos ficar neutros no momento em que vivemos uma situação muito grave no país. Temos de entender que é grave e estamos vivendo uma oportunidade de não voltar ao que já vivemos nesses quatro anos. Se não fizermos a nossa parte, daqui a quatro anos podemos estar a lamentar muito.”
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Defesa permanente da democracia
Posteriormente, a perspectiva apresentada por Maria Alice Setubal dialoga com a apresentação feita por Cida Bento. Durante a sua fala, Cida destacou que para o Brasil ser um país de fato democrático, é fundamental que se enfrente o medo da diversidade. “Se queremos mesmo um país mais democrático, ele tem de ser mais equânime. Para isso, é necessário mudar o perfil das nossas instituições: deve ser mais múltiplo e diverso, pensando que a diversidade é sempre ameaça [ao status quo]. Do lado oposto estão o pensamento único e a uniformidade que queremos mudar – o convívio com a multiplicidade é assustador.”
Durante o diálogo, Conrado Hübner Mendes destacou a necessidade de a Sociedade Civil ser permanentemente vigilante quando o assunto for a proteção da democracia. O alerta abrange, pois, o que ele chamou de “alarmismo inteligente e pragmático”. “Temos desafios muito imediatos e devemos ter consciência pragmática de que mudanças profundas são urgentes, mas sempre lentas. Para que aconteçam, a continuidade democrática é necessária e, para isso, precisamos vencer as eleições de 2026. Nesse sentido, a atitude ética mais responsável, necessária e justificável é o alarmismo: não o que paralisa e gera pânico e excessivo esforço em um foco exato, mas sim o alarmismo inteligente e pragmático.”
Finalmente, Stephen Hawkins enfatizou o combate à polarização política como central para a reconstrução do tecido democrático. Além disso, ele destacou como as OSCs têm papel estratégico nesse cenário. “O que pode fazer a sociedade civil? Construir uma cultura de entendimento, unidade e diálogo para tentar reconstruir a nossa sociedade, a nossa cultura, e construir pontes. A More in Common vê pelo menos um papel da sociedade civil, sendo a reconstrução de uma cultura de diálogo saudável e mais forte do que as forças de divisão, radicalização e de fratura.”
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Texto: Amauri Eugênio Jr. / Imagem: Dener Alcardi