Edital fomenta projetos voltados à promoção da equidade racial na educação básica
Por Amauri Eugênio Jr. / Foto: Santi Vedrí / unsplash.com Uma das características mais alarmantes na educação básica diz respeito aos níveis muito baixos de equidade racial. De acordo com o Indicador de Desigualdades e Aprendizagens (IDeA), a região Sudeste concentra a maior proporção de municípios com qualidade alta de aprendizado em Matemática […]
Por Amauri Eugênio Jr. / Foto: Santi Vedrí / unsplash.com
Uma das características mais alarmantes na educação básica diz respeito aos níveis muito baixos de equidade racial. De acordo com o Indicador de Desigualdades e Aprendizagens (IDeA), a região Sudeste concentra a maior proporção de municípios com qualidade alta de aprendizado em Matemática para o 5º ano, com 72% apresentando indicadores positivos nesse quesito. No entanto, 50% dessas cidades têm desigualdade alta de raça, enquanto apenas 6% têm equidade racial.
A desigualdade racial nas escolas motivou a criação do Edital de Equidade Racial na Educação Básica: Pesquisa Aplicada e Artigos Científicos. A iniciativa, que será lançada em 13 de abril, é de autoria do Itaú Social e é realizada pelo Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (Ceert). As instituições parceiras no desenvolvimento do edital são a Fundação Tide Setubal, o Instituto Unibanco e o Unicef.
Além dos dados apontados pelo IDeA, pesquisas mostram que o combate à desigualdade racial no ambiente escolar é uma pauta urgente. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 44,23% dos jovens negros com idades entre 19 e 24 anos não haviam conseguido concluir o ensino médio em 2018. Para completar, um estudo do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) identificou que 48,41% dos jovens reprovados em escolas brasileiras eram negros – esse número é duas vezes maior em comparação com alunos brancos.
Para Patrícia Mota Guedes, gerente de pesquisa e desenvolvimento da Fundação Itaú Social, o edital “é uma ação de fomento voltada ao apoio de pesquisas aplicadas e artigos científicos que apontem soluções para reverter o desafio das desigualdades raciais nos resultados de desempenho, aprendizagem e permanência na escola.” Ou seja, trata-se de edital que visa movimentar escolas, organizações sociais, coletivos, secretarias de Educação para desenvolver pesquisas em conjunto com pesquisadores.
De acordo com Mario Rogério e Luciana Alves, respectivamente diretor financeiro e consultora de projetos do Ceert, a opção pelo desenvolvimento de pesquisa aplicada, ou seja, que pode ser criada em colaboração com os envolvidos em seu desenvolvimento, foi feita por ser possível subsidiar o desenvolvimento de políticas e processos de gestão inovadores com papel direto na construção de igualdade de oportunidades educacionais e para reverter desigualdades sociais – isso não seria possível com pesquisas científicas, por exemplo.
Deste modo, serão analisados fatores voltados a processos, como a gestão do sistema e das instituições de ensino, práticas pedagógicas, materiais didáticos, linguagem e relações e interações entre professores, alunos e gestores podem simbolizar dificuldades no acesso pleno de estudantes negros à aprendizagem. A mesma lógica é aplicada às estratégias usadas pelas escolas no que diz respeito à equidade. “O edital visa incidir sobre esses dois conjuntos de questionamentos. As pesquisas fomentadas poderão fornecer pistas valiosas sobre que aspectos do cotidiano escolar necessitam revisão, demandam intervenção dos gestores e professores e/ou precisam ser construídos para garantir equidade de raça e gênero”, pontuam Luciana Alves e Mario Rogério.
Categorias e linhas temáticas
O edital contemplará as categorias Artigo, na qual serão premiados trabalhos que tragam contribuições para a construção de equidade de gênero e raça, e Projeto, que contará com as linhas temáticas a seguir que possibilitarão o desenvolvimento de pesquisas:
- Políticas de gestão da equidade: o foco recai sobre o estudo do clima escolar e das violências que podem marcar o cotidiano e que se baseiam em exclusões de raça e gênero. Os projetos desenvolvidos deverão considerar dados desagregados por sexo e cor para compreensão posterior sobre como eles são cruzados;
- Perspectivas epistemológicas e processos de aprendizagem e ensino e Processos curriculares e abordagens pedagógicas inovadores: nestas duas modalidades, pensadoras(es) negras(os) são consideradas(os) fontes de conhecimento e de referência para a construção de aprendizagens em contraposição ao currículo tradicional construído com base eurocêntrica.
Fomento à pesquisa
Um dos aspectos mais significativos do Edital de Equidade Racial na Educação Básica: Pesquisa Aplicada e Artigos Científicos é a articulação entre academia e comunidade escolar. De acordo com Fábio Tsunoda, coordenador de Programas e Projetos da Fundação Tide Setubal, a integração entre esses dois setores é uma premissa para a realização do edital.
“Isso está presente em diversos momentos do processo, seja na composição das equipes que construirão e executarão as pesquisas aplicadas selecionadas – que deverão ser propostas por pesquisadoras(es) com experiência na temática em cooperação com a escola –, seja no processo de disseminação dos artigos e resultados das pesquisas em processos formativos com professores, gestores e equipes escolares”, destaca Tsunoda. O objetivo é promover o diálogo e o compartilhamento de experiências entre esses atores de modo que possa contribuir com a reflexão e a implementação de práticas para equidade racial e de gênero no ambiente escolar.
Outro aspecto a ser destacado, segundo a gerente de pesquisa e desenvolvimento da Fundação Itaú Social, é o fato de pesquisas selecionadas precisarem ter um comitê responsável pelo acompanhamento e pela tomada de decisões na produção da pesquisa: representantes de organizações sociais, coletivos, escolas e secretarias de Educação farão parte desse grupo em conjunto com os pesquisadores.
“Vemos como um ponto forte a valorização do trabalho de pesquisadores. Parece ser algo óbvio, mas acredito que uma ação de fomento que valoriza pesquisadores que estejam trabalhando a temática e tenham abertura para trabalhar em parceria e não simplesmente estudando escolas, secretarias e organizações, é também um ponto forte e um catalisador desses pesquisadores e aprendizado”, pontua Patrícia Mota Guedes.
Deste modo, mais do que os artigos e projetos circularem em canais tradicionais de pesquisa, eles poderão ser disponibilizados para profissionais que estiverem em postos de tomada de decisão no ambiente escolar, nos territórios onde essas escolas estão situadas, nas secretarias de Educação e em demais órgãos governamentais.
Saiba mais
O Edital de Equidade Racial na Educação Básica: Pesquisa Aplicada e Artigos Científicos será lançado em 13 de abril. Informações estarão disponíveis no site e nas redes sociais relativas ao edital.