Juventude democratizada
Juventudes de realidades plurais falam sobre o que é necessário para anular a influência de iniciativas extremistas na sociedade
Esta é a terceira de uma série de reportagens especiais sobre juventudes e democracia. Confira as demais reportagens na seção de notícias do nosso site.
Ao mesmo tempo em que o processo eleitoral de 2022 representou a chance de um recomeço para o fortalecimento da democracia e da cidadania ativa, ao menos em âmbito presidencial, os ataques de teor terrorista contra as sedes dos Três Poderes, ocorridos em Brasília em 8 de janeiro, mostraram que o caminho para reestruturar o tecido democrático será ainda maior do que se imaginava.
Para sair da rota de radicalização e polarização na qual o Brasil foi colocado, uma série de medidas multidisciplinares são fundamentais. Mas todas elas passam pelo protagonismo das juventudes nesse processo. Para entender o que as juventudes entendem sobre protagonismo, participação política e fortalecimento do tecido democrático, a Fundação Tide Setubal ouviu jovens ativistas sobre as visões delas/es sobre política, governo e democracia. Afinal, elas/es não são o futuro do Brasil: são o presente mesmo.
A pedagoga Paloma Pereira considera que a participação política das juventudes – e de grupos minorizados – é mandatória. Isso começa pela busca pela diversificação dos perfis de quem ocupa espaços de poder e decisão. “A participação jovem pode trazer um novo ar, com pensamentos menos conservadores e mais agregadores. Isso considera uma democracia para todos que inclua a participação desde a juventude, ao fazer com que a política seja parte da nossa vida desde sempre e não ser apenas ‘papo de adulto’, pois as decisões sempre afetam a todos, independentemente da idade.”
Além disso, Wesley Xavier, integrante do coletivo Cinequebrada Produções, considera que refletir sobre políticas públicas no Brasil é a mesma coisa do que fazê-lo sobre o quanto a população é responsável por gerir o país. Essa dinâmica passa, inclusive, pelas esferas legislativa e executiva não se responsabilizarem como esperado quando se fala em desenvolvimento humano. Além disso, o jovem destaca como os atos golpistas de 8 de janeiro estão relacionados à estrutura sociopolítica do Brasil. Ou seja, se trata de atos isolados.
“As/os terroristas falam sobre um movimento que legitima ações de um pacto da branquitude que ocorre há anos e busca preservar o poder nas mãos de pouquíssimas pessoas. A periferia já se move e trabalha pela transformação social e pela democracia desde que ela existe e não são apenas os ataques extremistas que causam temor aos corpos periféricos. Continuo acreditando no trabalho de base e acredito pouco no movimento partidário brasileiro, pois vivemos em um contexto que aplica métodos de um Brasil antigo, colonial e que somente percebe a população periférica e preta como mão de obra.”, pondera o jovem.
Como combater o extremismo?
De acordo com Caio Santos, fundador da Griô Podcasts, o episódio extremista está correlacionado ao modo como governantes lidaram – ou não – com problemas estruturais históricos. Essa lógica vale também para a postura em relação aos envolvidos. Nesse caso, em especial quem planejou, pode representar uma oportunidade histórica para acertar contas com o passado.
“Este problema começou lá atrás, quando o Brasil, na contramão de outros países que passaram por ditaduras, não puniu devidamente agentes do Estado que golpearam os direitos das/os brasileiras/os na ditadura – e não podemos repetir isso novamente. A partir do entendimento de que golpe de Estado não é a mesma coisa que se manifestar livremente, conseguiremos sair dessa cilada que nos colocamos.”
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O momento atual da política brasileira pede para a defesa da democracia ser uma bandeira constante da sociedade civil, para além do período eleitoral. É isso o que considera Luciana Petersen, coordenadora de comunicação do projeto Novas Narrativas Evangélicas. Para a jovem, é mandatório investir na formação política das juventudes e fortalecer grupos e movimentos sociais atuantes nessa causa.
“Quando fortalecemos ativistas, lideranças e vozes da juventude que produzem incidências importantes em seus territórios, podemos disputar narrativas que prevalecem na mente de grande parte da população e garantir que a defesa da democracia não seja uma pauta que aparece somente a cada quatro anos”, descreve.
Amanda Costa, diretora-executiva do Instituto Perifa Sustentável, considera que o fortalecimento do processo democrático e participativo tem dinâmica multidisciplinar. O primeiro passo, segundo a jovem liderança, consiste em pressionar tomadoras/es de decisão por meio de estratégias de advocacy. Isso abrange mobilizar a população sobre o que é debatido na esfera legislativa e promover engajamento social. Outro ponto importante para Amanda consiste em promover estratégias de educomunicação. Ou seja, educar por meio de recursos de mídia – em particular via mobilização em redes sociais ou posicionamento de veículos midiáticos hegemônicos.
Ainda, a diretora-executiva do Instituto Perifa Sustentável entende que políticas públicas precisam ser territorializadas para chegar aos territórios periféricos. Essa lógica funciona, inclusive, como instrumento para garantia de direitos. “As políticas públicas precisam abraçar toda a população e não apenas contemplar um determinado grupo de interesse – quem tem poder financeiro, político e para fazer advocacy em Brasília. É necessário que essas políticas sejam de fato para desenvolver todo o mundo na ação e não apenas beneficiar um grupo.”
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Texto: Amauri Eugênio Jr. / Foto: Kelly / Pexels