A Teoria da Mudança do Jardim Lapena propõe um conjunto de indicadores para transformação territorial e objetiva atuar, de modo multidisciplinar. O seu objetivo consiste em melhorar a qualidade de vida da população do bairro situado na zona leste de São Paulo.
A partir dos indicadores de desenvolvimento presentes na publicação A Lupa na Cidade, lançada em 2021, o foco no bairro da zona leste resultou na produção de 37 resultados, em um painel com 64 indicadores. A saber, as categorias que organizam os resultados são as seguintes:
Nesse sentido, a Teoria da Mudança do Jardim Lapena tem como foco, ao impulsionar a transformação do bairro, reduzir desigualdades e fortalecer ações e agentes do bairro, em indicar pontos sobre os quais a equipe da área de Prática de Desenvolvimento Local deve incidir, em parceria com a população do território, para alcançar tais objetivos.
“Foi importante juntar todas as organizações locais e grupos comunitários para entendermos, em conjunto, a Teoria da Mudança e pensarmos em como utilizá-la no território. Sendo assim, ela virou um guia para direcionarmos nossas ações em prol dos resultados esperados que são medidos a cada dois anos”, descreve Andrelissa Ruiz, coordenadora de Prática de Desenvolvimento Local.
Para além de se estabelecer metas por meio da Teoria da Mudança do Jardim Lapena, analisar o andamento delas é fundamental para garantir que elas sejam efetivas. Nesse sentido, destaca-se o fato de que as organizações parceiras não fazem apenas parcerias entre elas. Logo, elas estabelecem parcerias e projetos com moradoras e moradores que se articulam em algum grupo comunitário. E, desse modo, as partes envolvidas estabelecem parcerias e projetos, valorizando sabedorias e dinâmicas locais.
A atuação em conjunto com instâncias diversas da comunidade é, então, um aspecto central no envolvimento de Daniele Francine, liderança Guardiãs do Território e coordenadora do Espaço Cuidar, com a realidade do bairro. O seu envolvimento no cotidiano do Jardim Lapena, que começou por meio da aproximação com o trabalho desenvolvido no Galpão ZL e do Plano de Bairro, a permitiu compreender a luta de lideranças do território para melhorar a realidade local.
E essa relação com o cotidiano do bairro intensificou-se durante a pandemia de Covid-19, quando participou do surgimento do grupo que resultaria nas Guardiãs do Território. “As Guardiãs foram multiplicando-se. Fomos conhecendo a realidade das outras moradoras e nos ajudando umas às outras. Assim o coletivo foi crescendo e fui crescendo junto com ele.”
Desse modo, ao considerarem-se as mudanças que passaram a ocorrer no bairro, inclusive por meio da Teoria da Mudança do Jardim Lapena, Daniele considera que, conforme a população do território aprendeu a dialogar com o poder público, conhecer os seus direitos e ajudar-se mutuamente, “a comunidade só cresceu desde então.”
“Cada vez mais, a comunidade tem visto que a participação junto às lideranças e ao território na luta ganha força – e temos conseguido muita coisa. Então, a população do território entende e reconhece a luta e as conquistas”, reforça.
Um ponto intrínseco à efetividade da Teoria da Mudança do Jardim Lapena é a dimensão multidisciplinar e plural, mandatória para ser possível transformar a realidade do bairro. “Não há outra forma de fazer: a vida das pessoas envolvidas não é segmentada em temas ou áreas”, pondera Andrelissa.
Alguns exemplos são as obras de caminhabilidade, realizadas no decorrer de 2024 para requalificar calçadas e vias públicas do Jardim Lapena. Idem às ações de advocacy colaborativo, que envolveram Fundação Tide Setubal, comunidade e poder público, para viabilizar a realização de tais intervenções.
“A estratégia de advocacy colaborativo foi extremamente importante para acelerarmos esses processos de melhorias. Isso vale também para conseguirmos traduzir ao poder público o que a comunidade queria, com obras adequadas às dinâmicas locais e respeitando histórias antigas, ao mesmo tempo que atendeu novas necessidades do bairro”, reforça a coordenadora de Prática de Desenvolvimento Local da Fundação Tide Setubal.
Um ponto resultante da Teoria da Mudança compreende o engajamento da população nas ações para melhorar a qualidade de vida do bairro. Assim sendo, os grupos de trabalho (GTs) têm papel fundamental para fortalecer essa dimensão e assegurar melhorias constantes e rápidas na realidade local.
O envolvimento da afroempreendedora Kelly Cristiane, também integrante do grupo Guardiãs do Território e participante do GT de Economia Solidária, no processo de transformação do bairro vem de muito antes de os GTs surgirem.
À época da pandemia de Covid-19, ela e outras quatro moradoras do bairro receberam apoio, por meio do Galpão ZL, para confeccionar máscaras para a população local, e participaram de processo de aceleração empreendedora dentro do projeto Inova ZL. E esse processo foi a porta de entrada para ela ser convidada a participar do início das atividades das Guardiãs do Território.
“O Galpão ZL teve papel fundamental para isso acontecer. Ficamos mais fortes e mais unidas, e não paramos por aí. Nós nos descobrimos líderes comunitárias. Apesar de eu ter vindo da nação do candomblé e, naturalmente, já fazia junto com a minha comunidade movimentos como ações com as crianças e montagem de cestas básicas para as famílias necessitadas, somente entendi o meu papel no mundo após as ações do Galpão ZL”, narra.
O passo seguinte de Kelly Cristiane foi o convite para compor o GT de Economia Solidária. Esse processo permitiu, por meio de formações e contatos com organizações atuantes nesse contexto, a compreender a premissa da economia solidária e o seu impacto social. Em seguida, ela envolveu-se na criação da Coopellap, cooperativa de mulheres costureiras do Jardim Lapena, que entrou em operação em dezembro de 2024.
A iniciativa contou com aporte financeiro da Fundação Tide Setubal para viabilizar o aluguel de um salão por um ano. Mas havia ainda outras camadas. “As máquinas de costura estavam há muito tempo paradas e não tínhamos dinheiro para consertá-las. Foi quando inscrevi um projeto baseado na Teoria da Mudança e, mais uma vez, a Fundação nos apoiou com R$ 5 mil para as reformarmos.”
A Coopellap conta com duas iniciativas educacionais e de inclusão produtiva. Um deles é um programa de jovem aprendiz, voltado para jovens de 16 a 18 anos, por meio do qual três jovens do bairro integram a equipe da cooperativa. O outro consiste em programa de estágio desenvolvido em parceria com a Uni-Diversidade da Quebrada, do Instituto NUA, por meio do qual três mulheres são encaminhadas para fazer estágio de três meses na Coopellap e, desse modo, prepararem-se para se recolocar no mercado de trabalho.
“O nosso propósito é construir futuros melhores com dignidade para essas mulheres e famílias e fortalecer nossas raízes”, reforça Kelly.
Essa descrição dialoga com a reflexão que Andrelissa Ruiz propõe sobre as ações implementadas serem mais assertivas com o envolvimento da população. “Além de moradoras e moradores criarem ações embasadas nas necessidades do território, ainda conseguem conectar com os resultados da Teoria da Mudança. E, desse modo, conseguem pensar em projetos cada vez mais estruturais.”
Ainda que as transformações no bairro sejam visíveis, não é possível obter a totalidade dos objetivos da Teoria da Mudança do Jardim Lapena em curto prazo.
O foco está, enfim, em garantir que as melhorias possibilitem o bairro ser, em longo prazo, um estudo de caso quando se fala em desenvolvimento local. E essa dimensão dialoga com o plano para que as transformações colocadas hoje em prática no território estejam totalmente efetivas em 2030.
“Há muitas melhorias acontecendo, como obras do plano de bairro e ações dos GTs. Todas as ações visam ao [objetivo] Lapena 2030, em que poderemos ter resultados mais sólidos de um bairro com infraestrutura mais adequada. Isso vale também para melhorias nas condições socioeconômicas e em haver mais acesso a oportunidades para a população”, finaliza a coordenadora de Prática de Desenvolvimento Local da Fundação Tide Setubal.
Confira os 37 resultados da Teoria da Mudança e as metas do plano Lapena 2030 no site Lupa na Cidade, baseado na publicação homônima.
Texto: Amauri Eugênio Jr.
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