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Produção de habitação de interesse social para públicos que realmente precisam dessa política – Entrevista de Fabiana Tock e Bianca Tavolari

Analisar e fiscalizar a produção de Habitação de Interesse Social (HIS) é uma dimensão obrigatória quando se fala em aceleração e qualificação do desenvolvimento de infraestrutura urbana em regiões de maior vulnerabilidade.

 

Essa dimensão conecta-se com a busca de se produzir e sistematizar conhecimentos para aprimorar políticas públicas com esse propósito. Idem o processo para identificar barreiras para implementá-las. Ambas as perspectivas têm papel central para os quatro cadernos que compõem o estudo Monitoramento da Produção de Habitação de Interesse Social por Atores Privados em São Paulo.

 

Com desenvolvimento de Fundação Tide Setubal e Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), a pesquisa objetiva monitorar a produção de HIS por atores privados. Nesse sentido, mobiliza também estratégias para monitorar a destinação de unidades habitacionais. Idem o perfil de moradias feitas por agentes privados na capital paulista, onde estão localizadas e quem compõe esse mercado.

 

Tais aspectos nortearam a entrevista que Fabiana Tock, coordenadora do Programa Cidades e Desenvolvimento Urbano da Fundação Tide Setubal, e Bianca Tavolari, professora da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV) e pesquisadora do Cebrap, coordenadora do estudo, concederam para o podcast Café da Manhã, da Folha de S.Paulo.

 

Fabiana Tock trouxe à tona uma das dimensões da pesquisa, sobre o panorama comparativo de HIS no país. “Não existe, nas diferentes capitais do Brasil, uma definição única do que é HIS. Cada capital define do seu jeito. Há cidades que chamam de habitação popular, habitação de baixa renda ou, simplesmente, HIS”, pondera.

 

Ainda, Tock destaca, na mesma entrevista, como o alcance de políticas de HIS representa desafios para o seu objetivo. “A amplitude da focalização traz o risco de a classe média ocupar um espaço que deveria ser ocupado para a baixa renda. Essa é justamente a base do déficit habitacional brasileiro.”

 

Produção de habitação de interesse social em perspectiva

Ao ter como objetivo monitorar a produção de HIS por atores privados na capital paulista, os quatro cadernos da pesquisa Monitoramento da Produção de Habitação de Interesse Social por Atores Privados em São Paulo consiste no acompanhamento em duas pontas.

 

A saber, uma dessas pontas consiste nos incentivos que o poder público concede a agentes privados para produzi-las. Já a outra diz respeito ao controle de quem as adquire. Assim sendo, objetiva-se contrastar o dinheiro público com destinação à política por meio de incentivos com os resultados em termos de melhorias nas condições de moradia para a população mais pobre de São Paulo.

 

Ao considerar o panorama posterior à aprovação do Plano Diretor de 2014 e da Lei de Zoneamento de São Paulo, de 2016, os quatro cadernos do estudo têm os seguintes temas:

 

Sobre análise e descobertas

Ao ponderar sobre os incentivos concedidos para agentes responsáveis pela produção de habitação de interesse social, Bianca Tavolari trouxe à tona, durante a entrevista para o podcast Café da Manhã, os impactos que empreendimentos têm em âmbito comunitário.

 

“Quando alguém constrói, gera-se ônus para o coletivo, que precisa ser compensado”, destaca, ao trazer à tona o conceito de Outorga Onerosa do Direito de Construir (OODC). Trata-se, então, de concessão que o poder público emite para a pessoa proprietária de um determinado imóvel construir acima do coeficiente básico estabelecido. Contudo, isso acontece mediante o pagamento de contrapartida financeira justamente por causa dos impactos coletivos que possam vir à tona. Algumas dimensões passam por saneamento básico, fornecimento de energia elétrica e pelo trânsito.

 

A saber, a pesquisa Monitoramento da Produção de Habitação de Interesse Social por Atores Privados em São Paulo identificou que a isenção do pagamento de OODC foi o incentivo mais frequente à construção de HIS. Ou seja, entre as 27 capitais analisadas no primeiro caderno, 12 entre elas (44% do total) previam esse tipo de benefício.

 

Além desse aspecto, Tavolari abordou o fato de que as construtoras consideram, então, aspectos mercadológicos quando se fala na construção de unidades de HIS. “A incorporadora que quer produzir Habitação de Interesse Social não precisa perguntar para a prefeitura qual é a demanda por HIS: ela simplesmente olhará para o próprio modelo de negócio e calculará, com base nos incentivos e benefícios que ela pode ganhar produzindo HIS, se faz sentido para ela produzi-las. Quantas unidades? Quantas ela quiser.”

Caminhos possíveis e construção coletiva

Outro ponto, quando se fala na produção de HIS, passa pelo alcance ao público-alvo. Assim sendo, a pesquisa identificou que, em meio aos benefícios que o poder público concede para construtoras empreenderem obras com esse teor, a destinação alcança famílias cujas faixas de renda transcendem os públicos-alvos que tais projetos objetivam alcançar.

 

Ou seja, unidades de HIS alcançam, não raras vezes, públicos que não sofrem com déficit habitacional. “Estamos destinando recursos públicos para faixas de renda mais altas ou médias, ou mesmo nos casos de fraude, para faixas de renda completamente desenquadradas e sem qualquer justificativa para que acedessem a fundo público. Ou mesmo enriquecendo ilicitamente e construtoras no caso de SP durante os 11 anos em que a política esteve em vigor dessa maneira”, pondera Bianca Tavolari.

 

Para contornar esse cenário, uma solução pode ser a criação de mecanismos para focalizar públicos que de fato precisem ser alcançados por políticas de HIS. Para tanto, a unificação de critérios em âmbito federal, assim como integração de bancos de dados públicos, podem ser estratégicas.

 

“Há uma contribuição importante do Governo Federal que poderia ajudar bastante no sentido de alinhar regras. Por exemplo, estimular que os incentivos municipais sigam critérios de focalização mais claros, criando cadastros únicos de demanda, cruzando dados com as políticas sociais, como o Bolsa Família, e garantindo esse subsídio direto para quem não tem condição de financiar”, reforça Fabiana Tock.

 

Finalmente, Tock destaca aspectos óbvios sobre a produção de habitação de interesse social: “o déficit habitacional pesa muito mais para quem vive com baixa renda.” Idem a destinação do orçamento público para a eficiência de ações com esse perfil. E isso passa pela fiscalização dos benefícios que o Estado – em âmbito municipal – destina. “Os recursos públicos são escassos. Logo, precisa-se de outra racionalização desse uso.”

 

Saiba mais

Baixe os quatro cadernos da pesquisa Monitoramento da Produção de Habitação de Interesse Social por Atores Privados em São Paulo no site da Fundação Tide Setubal.

 

Por fim, ouça também a íntegra da entrevista no podcast Café da Manhã, da Folha de S.Paulo e do Spotify.

 

 

 

Texto: Amauri Eugênio Jr.

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