Diálogos sobre estratégias e ações necessárias para promover a diversidade e a inclusão no ambiente corporativo deram o tom do evento Plataforma Alas em Debate. Realizada no Itaú Cultural, a atividade marcou o lançamento da série Caminhos: Trilhas Coletivas pela Equidade Racial, com os três primeiros episódios da série usados como disparador para as mesas de debates integrantes da programação.
O primeiro episódio da série Caminhos: Trilhas Coletivas pela Equidade Racial foi o pano de fundo para a primeira rodada de diálogos, Qual o compromisso do RH com a trajetória de pessoas negras?. Com mediação de Kenia Cardoso, coordenadora do Programa Nova Economia e Desenvolvimento Territorial da Fundação Tide Setubal, a mesa contou com participações de:
A partir de sua trajetória, Isaura destacou, durante sua fala, os constantes empecilhos nas vidas de pessoas negras e periféricas no desenvolvimento profissional. Diversos pontos vão além da formação propriamente dita, como fluência em outro idioma e acessos a cursos – esses pontos retroalimentam estruturas socialmente desiguais. Isso torna-se ainda mais evidente por elas terem de se preocupar com aspectos como estruturais, como acesso à saúde e educação deficitária em seu percurso.
Desse modo, empresas precisam olhar para o contexto de pessoas negras com trajetória periférica. “Você passa cinco anos dentro de uma faculdade, mas os nomes de ordem e o mercado não lhe absorvem. Não é por conta de competência. É porque como pessoa negra você não tem acesso a essa estrutura. Você não pode ficar cinco, dez anos depois de formado para poder investir na sua carreira e conseguir dialogar com pessoas. Se você não consegue sequer ter acesso, você não será chamado para aquele espaço.”
Isaura ressalta também o relacionamento para haver chances de ter acessos e para contratações. “Quem contrata precisa considerar qual tipo de pessoa será contratada/o oportunidade que posso dar, considerando a diversidade do que é, pois o currículo da pessoa não chegará pronto.”
Em seguida, Nadiane Martins destacou ações colocadas em prática. Algumas abrangem a busca por profissionais de universidades para além das tradicionais e a eliminação de etapas excludentes em processos seletivos.
“Não é só contratar. Como a gente consegue garantir que essas pessoas estejam comosco? Outra coisa que aprendi: melhor do que entender o que as pessoas precisam é ouvi-las e construir junto. O RH precisa ter coragem de refazer tudo e entender que, para chegarmos lá, precisamos ter coragem de dizer que não sabemos fazer ou o que é incluir”, destaca a HR Lead Latam na Compra Agora.
Ainda nessa chave, Denise Silva destacou que não há mais espaços para perspectivas como “diminuir a régua” sobre diversidade e inclusão. Nesse sentido, um ponto de destaque abrange medidas para a permanência de grupos sociais minorizados. “Um dos movimentos é buscar pela representatividade, mas também preparar esse espaço para essas pessoas. Ao passar pelo caminho da inclusão, o que acaba acontecendo muito: o movimento da pessoa recém-chegada moldar-se àquele ambiente já posto. Com isso, chega-se ao ponto de não se sentir pertencente ao espaço.”
Por isso, a gerente de Equidade Racial do Vetor Brasil destacou a urgência de as organizações desfazerem-se de suas amarras estruturais e preparar um ambiente mais inclusivo. “A organização precisa também passar pelo processo de reestruturação: colocando metas, preparando pessoas para acolhida de quem está chegando e fazê-la conseguir colocar os seus talentos em prática.”
Assista aos episódios de Caminhos: Trilhas Coletivas pela Equidade Racial
A segunda mesa do evento teve como foco o papel do campo do Investimento Social Privado (ISP) para a formação de lideranças negras. O ponto de partida para o diálogo foi a exibição do segundo episódio da série Caminhos: Trilhas Coletivas pela Equidade Racial, justamente sobre o papel do ISP nesse contexto.
Viviane Soranso, coordenadora do Programa Raça e Gênero da Fundação Tide Setubal, mediou o diálogo. Participaram também da mesa:
Em sua fala, Cassio França destaca a importância de haver métricas para mensurar a diversidade racial no quadro de profissionais de empresas ou organizações. “Para mim, isso é um ponto de inflexão, pois a diversidade começar pela base da organização é importante – em qualquer lugar é importante. Mas mostrar isso no topo da organização revela um posicionamento político.”
Nesse sentido, Cassio França fez uma provocação para o campo do ISP colocar tais parâmetros em prática. “É possível fazer nesse campo, ainda mais nesse setor. Não esgotarei as métricas. Mas a diversidade nos cargos de liderança, para mim, me faz olhar para a gestão com outros olhos – ‘essa pessoa está entendendo o momento histórico dela’.”
Diana Costa, por sua vez, destacou o papel do tempo para a aplicação de parâmetros sobre diversidade e inclusão ocorrer de modo pleno. Nesse contexto, falar sobre acelerar trajetórias de pessoas negras e de demais grupos minorizados, por exemplo, reforça a premissa segundo a qual elas estão atrasadas em relação a um processo prévio.
“Inverter essa chave analítica é importante para percebermos individualidades e especificidades dessa trajetória, considerar tudo isso dentro de processos seletivos e na construção de uma política de diversidade e inclusão. Acima de tudo, assumir compromisso mais efetivo nessa direção, independentemente de ser uma organização pequena ou maior, dos setores público ou privado. Todas, de forma geral, precisam assumir um compromisso efetivo com essa pauta”, reforça.
O diálogo sobre o papel do ISP para construir e pavimentar trilhas coletivas pela equidade racial contou com ponderações de Maria Páscoa Sarmento de Sousa. A partir das constantes ameaças às vidas de lideranças políticas quilombolas em seu território de origem, na Ilha do Marajó (PA), a liderança apoiada pelo Edital Traços considerou o apoio do ISP estratégico para a luta política – dentro de seu recorte sociopolítico, que acontece em seu território de origem. “Não queremos o assistencialismo. A nossa luta é política pública e, principalmente, pela articulação dos nossos territórios para termos autonomia de gestão dentro desses lugares.”
Por fim, a liderança destacou também a ação do ISP para auxiliar o fortalecimento da luta de lideranças com perfis análogos ao seu. “É necessário haver mais investimentos e que mais instituições caminhem no sentido de criar estratégias para garantir que mais pessoas como eu, mais pessoas negras e indígenas, possam desenvolver potencialidades ao máximo e criar um ambiente mais equitativo no Brasil”, completa.
+ Leia o relato sobre a segunda parte do evento Plataforma Alas em Debate
Texto: Amauri Eugênio Jr.
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