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Em debate, a relação entre identidade e memória

@Comunicacao

11 de novembro de 2009
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Na quinta-feira, dia 5, durante a 4ª Feira do Livro do CDC Tide Setubal, foi realizado o debate Histórias Individuais e Memórias Coletivas, com a presença da historiadora Karen Worcman, diretora do Museu da Pessoa, do cineasta Sérgio Roizenblit, diretor do documentário O Milagre de Sta. Luzia, e do jornalista Roniwalter Jatobá, autor de O Jovem Luiz Gonzaga, entre outros. A mediação foi realizada pelo cantor Zulu de Arrebatá, ex-integrante do Movimento Popular de Arte (MPA). O encontro marcou a abertura de uma série de quatro debates promovidos pela organização da Feira do Livro.

 

A historiadora Karen Worcman, do Museu da Pessoa, começou lembrando que a memória é um conjunto de registros eleitos por um indivíduo e/ou um grupo como algo significativo, capaz de construir uma identidade e uma maneira própria de enxergar o mundo. “No Museu da Pessoa, por exemplo, trabalhamos com a ideia de que cada pessoa é um livro”, afirmou. “Dessa forma, montamos na internet uma grande biblioteca, com histórias de vida de cada participante”.

 

O Museu da Pessoa já tem mais de 11 mil depoimentos no acervo, além de 72 mil fotos e documentos. “A memória é o nosso patrimônio”, disse Karen Worcman, “é como se fosse uma mala que carregamos”. Segundo ela, é organizando esse conjunto de malas que criamos a nossa própria história. Nesse sentido, por que os livros são importantes? “Quando lemos um livro, ganhamos ainda mais vida”, respondeu a historiadora, que leu para os cerca de 50 ouvintes da plateia relatos de moradores de São Miguel Paulista, contando como era o bairro no início do século passado, muito parecido com uma fazenda.

 

Na sequência, o jornalista Roniwalter Jatobá fez uma homenagem a Mário de Andrade, um dos responsáveis pelo tombamento da Capela de São Miguel Arcanjo, em 1938, monumento que deu origem ao bairro de São Miguel Paulista. “Mário de Andrade foi, sem dúvida, um dos mais sérios e talvez o mais brilhante trabalhador intelectual do Brasil do século passado”, afirmou, associando a atuação do escritor modernista ao nosso tempo presente. “Se estamos aqui hoje, discutindo esse tema, é porque o trabalho deste homem, lá no passado, teve consequências”.

 

Roniwalter Jatobá, que lançou na Feira do Livro a biografia O Jovem Luiz Gonzaga, também fez uma comparação entre o texto jornalístico e o texto literário. “O jornal, muitas vezes, acaba servindo para embrulhar sabão; já o livro traz histórias mais densas, servindo para enriquecer a nossa memória”, afirmou. E, ao final de sua fala, citou uma frase do poeta mexicano Octavio Paz. “A destruição da memória não afeta apenas o passado, mas também o futuro”.

 

O cineasta Sérgio Roizenblit, de O Milagre de Sta. Luzia, é um defensor da memória oral, “porque ela traz o ineditismo, e também cria particularidades”, disse o diretor, que atua há 20 anos como documentarista, “tentando mostrar como a história de uma pessoa simboliza a história de um povo”, afirmou. “Como documentarista, me dedico a ouvir os outros. E sempre pergunto antes de começar a filmar: quem é o mais velho aqui da região? Porque as pessoas mais velhas são sempre as guardiãs da nossa memória”, explicou.

 

A partir da experiência acumulada ao longo da carreira, Sérgio Roizenblit aponta a importância de preservar a memória e de conhecer a própria história. “A vida é conhecimento”, afirmou, “e o que nos move nessa trajetória é olhar para trás, não para a frente”, acredita. “Se perdermos o conhecimento da nossa história, perdemos também a nossa identidade”, disse. Sergio deixou uma sugestão aos jovens ouvintes. “Saiam daqui hoje e perguntem aos seus pais: qual é a nossa história? Talvez vocês mudem a vida de vocês quando souberem a história de suas famílias”.

 

Terminada a exposição dos convidados, a jovem Camila Tavares Brazão, estagiária do CPDOC (Centro de Pesquisa e Documentação), da Fundação Tide Setubal, fez um breve comentário crítico do debate, questionando por que a memória oral se perdeu. “Como podemos recuperar essa tradição?”, perguntou.

 

O jornalista Roniwalter Jatobá apontou o preconceito da sociedade moderna como uma das causas. “Hoje, nas cidades, o idoso é desprezado porque é uma pessoa que anda devagar num mundo que corre”, disse. “Já no Nordeste, onde o índice de analfabetismo é alto, essa tradição ainda sobrevive de alguma forma”, citou como exemplo. “Por isso, é importante insistir no resgate dessa tradição e levar esse trabalho adiante”, referindo-se as atividades desenvolvidas CPDOC São Miguel, de preservação da memória local.

 

Sérgio Roizenblit lembrou a plateia de que toda pessoa têm uma história. E citou uma frase do escritor russo Vladimir Nabokov para ilustrar como ela é decisiva em nossas vidas. “A vida é uma sucessão de bifurcações; depois da terceira, já não há mais como voltar”.

 

Karen Worcman, do Museu da Pessoa, também chamou a atenção para a questão cultural. “Na África, cada ancião que morre é como uma biblioteca que se queima. Já nos países ocidentais, essa visão se perdeu um pouco”, disse. “Além disso, os jovens hoje dão muito mais valor aos estímulos da mídia, como TV e internet. Então, estimular o aprendizado dessas ferramentas midiáticas talvez seja uma forma de os jovens redescobrirem o valor de ouvir os mais velhos, na medida em que podem gravar, editar e publicar esses relatos na internet”, sugeriu.

 

Para a historiadora, cada um de nós é uma interseção entre o individual e o coletivo. “Somos seres históricos, nunca estamos sozinhos. Ou seja, somos uma história que herdamos de outras pessoas sem saber”. Daí a importância de resgatá-la – e conhecê-la.

Conheça o documentário o Milagre de Santa Luiza(http://www.omilagredesantaluzia.com.br/)

 

Saiba mais sobre Museu da Pessoa (http://www.museudapessoa.net/)

Saiba mais:

Comunicação e Intervenções Comunitárias

 

Violência na Vida e na Escola

 

Espaço, Tempo e Pluralidades: a Poética Socioambiental


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