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Novo indicador mede a qualidade e as desigualdades na educação brasileira

@Comunicacao

10 de julho de 2019
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Menos de 1% dos municípios brasileiros tem qualidade alta em Língua Portuguesa e Matemática acompanhada de equidade de nível socioeconômico, tanto para o 5º quanto para o 9º ano. No 5º ano, ao passo que 8% dos municípios que possuem qualidade alta em Língua Portuguesa estão em situação de equidade de raça, a proporção chega a 49% de municípios com desigualdade alta.

 

A região Sudeste concentra a maior proporção de municípios com qualidade alta de aprendizado em Matemática para o 5º ano (72%). No entanto, desse total, 50% têm desigualdade alta de raça e apenas 6% contam com equidade.

 

Estes e tantos outros dados trazem à tona uma questão central hoje presente no país: as desigualdades educacionais vivenciadas por milhões de crianças e adolescentes no Brasil. Agora, essas evidências são possíveis de ser observadas com atenção e pautar com mais força ainda a necessidade de transformação da educação brasileira a partir do lançamento do Indicador de Desigualdades e Aprendizagens (IDeA), desenvolvido para medir a terceira dimensão do direito à educação: a aprendizagem.

 

Uma equipe de pesquisadores construiu o IDeA: José Francisco Soares, Professor Emérito da UFMG, concebeu o IDeA e liderou o desenvolvimento; Erica Castilho Rodrigues, professora do Departamento de Estatística da UFOP, integrou a equipe de pesquisadores, sendo corresponsável pelo desenvolvimento do IDeA; Mauricio Ernica, professor da Faculdade de Educação da Unicamp e conselheiro consultivo da Fundação Tide Setubal, coordenou e integrou a equipe que desenvolveu o IDeA; e Victor Maia Senna Delgado, professor do Departamento de Economia da UFOP, integrou a equipe de pesquisadores.

 

A iniciativa, que contou com o apoio da Fundação Tide Setubal para ser desenvolvida, foi apresentada na mesa “Definição e medidas de qualidade, equidade e desigualdade em educação” e abriu os trabalhos do primeiro dia do seminário “Democracia, Educação e Equidade: uma agenda para todos”.

 

A ferramenta ajuda a apontar situações em que os alunos não aprenderam o que deveriam, junto com aquelas em que indivíduos de um grupo aprenderam menos do que os de outro. Ou seja, leva em conta a qualidade da aprendizagem e, ao mesmo tempo, as desigualdades entre grupos de nível socioeconômico, raça e gênero.

 

De acordo com o professor José Francisco Soares, professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a verificação do direito à educação requer a observação conjunta dessas duas modalidades de exclusão educacional a fim de evitar as situações de baixo nível de aprendizagem, ainda que com baixa desigualdade, e as situações de desigualdade educacional, nas quais enquanto um grupo social tem aprendizagem alta, outro tem aprendizagem baixa.

 

“O resultado é a outra face do direito. Se não teve acesso, não permaneceu e não aprendeu, não houve garantia do direito. Por isso, equidade entendida como processo só não basta, é preciso tratá-la também como resultado. Políticas equitativas são compatíveis com desigualdades nos resultados. Portanto, o conceito de desigualdade deve ser considerado nas análises educacionais. Em suma, qualidade só para poucos não é qualidade. É preciso considerar a equidade tão importante quanto o acesso e a permanência para a garantia do direito.”

 

 

Metodologia

 

O IDeA foi calculado para os municípios brasileiros e está restrito à descrição da aprendizagem dos alunos que cumprem as etapas da escolarização analisadas, isso é, o primeiro e o segundo segmentos do Ensino Fundamental (do 1º ao 5º ano e do 6º ao 9º ano).

 

Os dados públicos da Prova Brasil de 2007 a 2015 permitiram chegar a duas medidas que compõem o indicador: a medida de excelência da aprendizagem, ou seja, do nível de aprendizagem do conjunto dos estudantes do município observado, definida pela distância entre a distribuição da aprendizagem desses estudantes e a distribuição adotada como referência; e a medida de equidade, dada pela distância entre as distribuições de desempenho de grupos de estudantes definidos por características sociais de nível socioeconômico, raça e gênero.

 

Para calcular a distribuição de aprendizagem de referência, foram adotados procedimentos metodológicos essencialmente iguais aos definidores das metas do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB).

 

“Tendo assegurando acesso, permanência e padrões mínimos, é necessário identificar quais variações são aceitáveis no aprendizado e em quais condições. Nosso PNE [Plano Nacional de Educação] pensa em padrões mínimos. Por mais que o IDEB tenha sido importante, ele tem o problema de estar baseado em médias. É importante garantir a equidade interna, mas também em relação às referências mundiais”, observou Mauricio Ernica, professor da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e coordenador da equipe de pesquisadores que desenvolveu o IDeA.

 

 

Análise de dados a partir do IDeA

 

Em uma análise de dados dos municípios brasileiros com base no IDeA com foco no 5o ano, notou-se que os municípios com aprendizagem alta e equidade de aprendizagem entre grupos de nível socioeconômico e raciais são raros em Língua Portuguesa e em Matemática. Nos níveis mais baixos de aprendizagem há maior concentração de municípios em situação de equidade. As regiões Norte e Nordeste contabilizam maior número de municípios em situação de maior equidade, mas baixa aprendizagem.

 

Já um estudo voltado ao 9o ano mostrou que nos níveis mais altos de aprendizagem, médio e médio-alto, a equidade é rara, e há maior concentração de municípios em situações de desigualdade. Os dois estudos encontram-se disponíveis no portal do IDeA.

 

Cristina Diniz, secretária municipal de educação de Natal (RN), acredita que o indicador dialoga com todos os municípios brasileiros, sobretudo os do Nordeste, no que se refere aos desafios na educação brasileira.

 

“No Brasil, existe uma desigualdade social muito grande e esse debate de hoje nos apoia para aprofundar o assunto junto ao prefeito e à equipe da Secretaria. Nós estamos, inclusive, organizando um programa de alfabetização de adultos baseado na pedagogia de Paulo Freire que terá início em meados de julho e agosto. Trata-se, justamente, de uma medida de combate à desigualdade na educação no nosso município.”

 

Arthur Henrique Machado, vice-prefeito e secretário municipal de educação de Boa Vista (RR), lembra que o seminário acontece em um momento oportuno para ajudar os roraimenses a lidar com o desafio de manter a qualidade da educação em regiões com grande fluxo migratório. De acordo com o vice, cerca de 18% da população de Boa Vista é composta por refugiados e aproximadamente 12% das vagas de escolas municipais são ocupadas por filhos dos venezuelanos acolhidos pelo município.

 

“Apesar de já trabalharmos com mecanismos de monitoramento muito semelhantes lá em Roraima, o seminário e a exposição do professor José Francisco nos ajudam a ajustar a prática e a entender como aplicar melhor os mecanismos”, afirmou.

 

Para Neca Setubal, presidente do Conselho da Fundação Tide Setubal, o IDeA permite à sociedade brasileira medir e descrever a realidade de sua educação e criar políticas públicas para solucionar situações de desigualdades educacionais.

 

“Temos aqui a possibilidade de avançar na busca por uma educação de qualidade para todos. O Brasil está batendo em um teto, não está evoluindo e, sem dúvida, um dos principais fatores para isso está nas desigualdades. Estamos deixando para trás de 20 a 30 por cento das crianças, dependendo do território. Temos de ter o sentido da urgência. Acreditamos na importância de buscar evidências que subsidiem políticas públicas e, por isso, apoiamos o desenvolvimento desse indicador e promovemos esse seminário.”

 

Na ocasião da mesa, Juan Cruz Perusia, chefe de seção, análise de dados e divulgação do Instituto de Estatística da UNESCO (UIS), apresentou o Manual para a medicação da equidade na educação. O documento fornece orientação prática sobre o cálculo e a interpretação de indicadores destinados a alcançar os grupos menos favorecidos, abordando as lacunas atuais de conhecimento e fornecendo uma estrutura conceitual para medir a equidade na aprendizagem, com base em exemplos de mensuração de equidade em sistemas educacionais nacionais de 75 países.

 

 

IDeA na prática

 

Ao final da programação do primeiro dia de seminário, uma oficina convidava os participantes a se familiarizarem com o portal do IDeA. Além de apresentar o indicador e as motivações por trás de sua construção, a plataforma disponibiliza pesquisas, casos e outros conteúdos que visam ampliar as discussões sobre desigualdades na educação brasileira.

 

No menu IDeA, os internautas podem navegar pelo indicador e pesquisar por filtros como série (5º ou 9º ano), raça, cor, nível socioeconômico, região, estado e município. Um tutorial de navegação também está disponível.

 

Leia mais sobre as atividades do primeiro dia do seminário aqui.


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