Por Daniel Cerqueira
O orçamento público pode ser um instrumento de enfrentamento das desigualdades socioeconômicas nas cidades, se pensado de forma regionalizada. É o que defende o projeto (Re)age SP, coordenado pela Fundação Tide Setubal e pela Rede Nossa São Paulo. Dentro dessa perspectiva, foi lançado em 6 de outubro, o Índice de (Re)distribuição Territorial do Orçamento Público Municipal, com a publicação de mesmo nome, que apresenta propostas de atuação dentro de outra lógica sobre o que é o orçamento.
A divisão dos recursos de um município é voltada, historicamente, para a chamada lógica setorial. Metas e planos são criados em cada área da cidade, como saúde, educação, cultura, entre outros. Porém, muitas dessas ações não são integradas e não são distribuídas espacialmente com vistas à equidade. Assim, territórios mais vulneráveis recebem menos investimento público do que lugares com uma ampla rede de serviços e assistência.
Dois exemplos podem ilustrar esse cenário. A subprefeitura de São Miguel, na zona leste da cidade, conta com valor per capita do orçamento dos “órgãos” na faixa de R$ 117 a R$ 143 e tem entre 93 mil e 205 mil famílias em “alta” ou “muito alta” vulnerabilidade. Por outro lado, Pinheiros, na zona oeste, tem valor mais alto, entre R$ 144 e R$ 162, e possui entre 0 e 6 mil famílias na mesma situação segundo o índice.
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Virando o jogo das desigualdades
O lançamento do índice ocorreu durante live no canal Enfrente e realizada em parceria com a Ação Brasileira de Combate às Desigualdades (ABCD), que com as participações de Mariana Almeida, superintendente da Fundação Tide Setubal; Jaílson de Souza e Silva, cofundador do Observatório de Favelas no Rio de Janeiro e conselheiro da Fundação; Jorge Kayano, pesquisador do Instituto Pólis e membro do colegiado da Rede Nossa São Paulo; e mediação de Andrelissa Ruiz, coordenadora de Prática de Desenvolvimento Local da Fundação.
Base da publicação, o Índice de (Re)distribuição Territorial do Orçamento Público Municipal é uma proposta para cada subprefeitura da cidade de São Paulo receber investimentos e novos serviços públicos de acordo com as suas necessidades, invertendo as prioridades e direcionando mais recursos para os territórios mais vulneráveis. O índice visa estabelecer critérios técnicos para a distribuição territorial da despesa no Plano Plurianual e nas Leis Orçamentárias Anuais.
Mariana Almeida frisa, logo no início da conversa, que “a gente traz uma proposta para ver se conseguimos colocar o orçamento na pauta das eleições e para mostrar que um bom orçamento, voltado à redução das desigualdades, pode ajudar a atingi-la.” Ainda que exista pobreza nas regiões centrais, são as bordas da cidade de São Paulo, em âmbito geográfico, as regiões mais vulneráveis que precisam, como consequência, de mais investimentos.
Ao visar estabelecer critérios técnicos para a distribuição territorial da despesa no Plano Plurianual e nas Leis Orçamentárias Anuais, o índice tenta capturar diversos aspectos da vulnerabilidade social e do déficit de infraestrutura que afetam as diferentes regiões da cidade. Para tanto, é calculado a partir de três variáveis principais, com pesos diferentes.
Para chegar ao índice, a primeira coisa analisada no território foi a infraestrutura urbana – água e esgoto, deslocamento casa trabalho e quantidade de domicílios, dando desconto à relação entre a extensão do território e presença de Operação Urbana Consorciada, instrumento usado pelo município para requalificar uma área. Deu-se a esse item 60% de importância para o cálculo final. A seguir, calculou-se os valores de vulnerabilidade social, incluindo as mortes por causas externas. Este item compôs 30% do índice. Além disso, a geografia e a demografia completaram os 10% faltantes.
A partir dos dados levantados, propõe-se que a próxima gestão municipal distribua a previsão de R$ 11,59 bilhões de investimento dos próximos quatro anos, ao priorizar as subprefeituras de M’Boi Mirim, Capela do Socorro, Campo Limpo e São Mateus, nessa ordem, e assim sucessivamente, de acordo com o quadro disponível no material. “Na prática, estamos falando que o território importa e devemos olhar para ele, fazendo um planejamento com este enfoque”, completa Mariana.