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O que o perfil de prefeitos mostra sobre representatividade na política?

Programas de influência

23 de janeiro de 2024
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O perfil de prefeitos no Brasil mostra descompasso veemente entre os grupos que ocupam espaços de poder e decisão e a composição sociorracial do país. De acordo com reportagem da Lupa, agência jornalística de checagem de fatos, os aspectos gerais passam longe do que se entende sobre paridade racial e de gêneros.

 

E isso torna-se ainda mais gritante ao considerar-se a composição racial no país. Entre os pouco mais de 203 milhões de habitantes, de acordo com o Censo 2022, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 55,5% declaram-se negras e negros (45,3% pardas e 10,2%, pretas). Ainda, 43,5% autodeclararam-se como brancas; 0,6% como indígenas e 0,4% amarelas, respectivamente. Além disso, 104,5 milhões são mulheres – ou seja, 51,5%.

 

Nesse sentido, o perfil de prefeitos no Brasil mostra, em que pese o aumento da presença de grupos politicamente minorizados, que há prevalência de homens brancos. De acordo com o levantamento da Lupa, com base em dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), entre as 19,3 mil candidaturas registradas em 2020, as de pessoas brancas corresponderam a 67,34% do total em 2020. Ainda, as de pessoas negras abrangeram 32,1% (30,07% pardas e 2,03% pretas), ao passo que candidaturas de pessoas de classificação amarela, de acordo com o IBGE, abrangeram 0,42%. Por fim, candidatas e candidatos indígenas corresponderam a 0,15%.

 

A paridade de gênero também passa longe também de ter parâmetros minimamente satisfatórios quando se fala no perfil de prefeitos no Brasil. De acordo com a mesma reportagem da Lupa, com base em dados do TSE, 87,94% das candidaturas foram masculinas, enquanto as femininas correspondiam a 12,06%.

 

 

 

Episódio Como é ser uma liderança política negra?, da série Caminhos: Trilhas Coletivas pela Equidade Racial

 

Retroalimentação da disparidade

Um ponto sobre no perfil de prefeitos no Brasil diz respeito à necessidade de colocar em prática medidas em favor da promoção da equidade e, assim, reduzir a sub-representação racial e de gêneros. De acordo com o relatório Desigualdade de Gênero e Raça na Política Brasileira, de Oxfam e Instituto Alziras, serão necessários até 144 anos para haver paridade de gêneros nas prefeituras quando se fala em gênero. No que diz respeito à clivagem racial, estima-se o prazo de 20 anos.

 

Algumas medidas nesse sentido compreendem a destinação de pelo menos 30% do Fundo Eleitoral para candidaturas femininas. Idem no repasse das verbas do Fundo Partidário e do Fundo Eleitoral de forma proporcional para candidaturas negras. No entanto, ambas as medidas foram alvos de mudanças por meio da minirreforma eleitoral e da chamada Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Anistia, respectivamente. Todavia, ambas as propostas, que visavam impactar também as medidas afirmativas, não serão válidas para as eleições de 2024.

 

Em que pese a cota para candidaturas femininas e o repasse proporcional para candidaturas negras estarem seguras por ora, as ações propostas para impactá-las seguem na contramão do que é necessário para aumentar a paridade racial e de gêneros na esfera política – e, consequentemente, mudar o perfil de prefeitos no Brasil. Um exemplo: levantamento da CNN Brasil, de 2022, mostrou que candidaturas negras receberam 47% menos recursos partidários em comparação com as de pessoas brancas.

 

 

+ Guia Orçamentos Sensíveis a Gênero e Raça

 

Para além do discurso

Em entrevista concedida em 2022, Tayguara Ribeiro, repórter da Folha de S.Paulo que produziu à época uma série de reportagens que mostram disparidades diversas dentro da política brasileira e do processo eleitoral, destacou um ponto central na atuação partidária.

 

Para além da candidatura de prefeitas e prefeitos, as agremiações influenciam a organização da vida legislativa em câmaras municipais e assembleias estaduais – além do Congresso Federal – a partir da indicação de nomes para comissões e na definição de projetos prioritários para bancadas, por exemplo.

 

“Isso mostra como uma coisa relativamente simples, que seria ter pessoas negras dentro da direção, afetaria todo o ecossistema político do Brasil. Isso só depende de mecanismos internos, de decisões internas da própria sigla dar espaço a essas pessoas negras e fomentar novas lideranças”, pondera.

 

Finalmente, Lia Vainer Schucman, doutora em Psicologia Social e professora do Departamento de Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), reforçou como a lógica que historicamente prioriza as candidaturas predominantes retroalimenta a lógica que estrutura a desigualdade no Brasil – inclusive quando se fala no perfil de prefeitos. Logo, medidas para grupos minorizados estão diretamente relacionadas à lógica de reparação histórica.

 

“Se há algo que é identitarismo, é sobre os brancos, mas há uma projeção de chamar lutas por direitos de identitarismo. Qual é a luta e qual é a demanda dos movimentos negros? Saúde, educação, dignidade e reconhecimento simbólico. Quais são as lutas feministas? Direito à creche, ao aborto, dignidade e à autodecisão. Chamar isso de identitarismo é má-fé”, finaliza.

 

 

+ Entrevista de Tayguara Ribeiro

 

+ Entrevista de Lia Vainer Schucman

 

 

 

Texto: Amauri Eugênio Jr. / RDNE Stock Project


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